Nestas primeiras semanas do Tempo Comum, durante as missas, estamos lendo a Carta aos Hebreus, um texto estupendo, muito bem elaborado do ponto de vista teológico. O autor conhece bem as tradições judaicas e também o conteúdo da fé cristã, centrando as suas reflexões sobre a novidade que Jesus Cristo significa para a humanidade. Também os destinatários conhecem bem a religião judaica e, certamente, eram cristãos vindos da sinagoga. Esta comunidade vivia tempos difíceis, com perseguições e martírios; além disso, um certo desânimo tomava conta dos seus membros, como se pode perceber nas expressões da Carta. Naqueles inícios do cristianismo, a liturgia cristã ainda estava pouco desenvolvida; os cristãos não tinham igrejas grandes, que fizessem recordar minimamente o templo de Jerusalém; voltava a lembrança das prescrições rituais de Moisés, sobretudo no que se referia ao sacerdócio e aos ritos do templo.
A comunidade dos “Hebreus” começou a sentir saudades das antigas tradições, das festas e dos sacrifícios de animais oferecidos a Deus, do sacerdócio e de toda a ritualidade no cumprimento da religião. Havia quem desistia da fé cristã e voltava atrás. Diante dessas dificuldades, o autor da Carta aos Hebreus escreveu este “discurso de exortação”, como ele mesmo diz (cf 13,22), desenvolvendo uma reflexão grandiosa sobre Jesus Cristo, autor de nossa salvação; e mostra que as promessas de Deus, feitas ao seu povo por meio dos patriarcas e dos profetas, realizaramse plenamente em Cristo, “grande sacerdote” da nova e eterna Aliança. É Ele o verdadeiro mediador entre Deus e os homens, pois veio da parte de Deus e uniu em sua pessoa nossa humanidade com Deus; em seu corpo prestou a Deus o culto novo e verdadeiro (“formaste um corpo para mim” 10,9), vivendo a plena “obediência a Deus”. Não mais é preciso pensar no templo de Jerusalém, pois na pessoa de Cristo temos agora o “lugar” do encontro com Deus e o acesso direto ao perdão e à fonte de toda bênção e consolação. Nem é preciso lembrar o santuário e o altar, onde se apresentavam o incenso e o sangue dos animais sacrificados, pois o novo altar é a cruz de Cristo, sobre a qual ele ofereceu a Deus Pai, também por nós, a própria vida e santificou todos. Para quê ainda pensar em animais sacrificados e no sangue de touros e de bodes, se o precioso sangue do Filho de Deus foi por nós derramado e é eficaz para nos purificar de toda culpa? Tudo aquilo era apenas anúncio e pálida figura do que deveria vir; e o sacerdócio de Cristo não faz olhar simplesmente para o passado, pois Ele é o “sacerdote dos bens futuros” (9,11) e nos leva à plenitude daquilo que ainda esperamos, ou seja, o encontro definitivo com Deus no “santuário do céu”. Agora todos nós, não apenas o sacerdote, podemos entrar no “santuário” com Ele, pelo “caminho novo” que inaugurou para nós” (10,19). Por isso, o autor da Carta aos Hebreus convida à confiança e à coragem, para enfrentar as tribulações do tempo presente, sem desanimar nem abandonar as assembléias, de- sistindo do caminho da fé. “Temos um grande sacerdote à frente da casa de Deus. Portanto, aproximemo- nos dele com o coração cheio de fé e confiança! Continuemos a afirmar nossa esperança, sem esmorecer; estejamos atentos uns aos outros, incentivando os desencorajados (cf 10, 22-25). E convida a recordar os primeiros tempos no caminho da fé cristã, quando alguns companheiros eram martirizados e os outros suportavam com alegria e coragem toda sorte de injúrias e humilhações por causa de Cristo: “é preciso que persevereis, para cumprir a vontade de Deus e alcançar o que Ele prometeu… Não somos desertores, para a nossa perdição, mas perseveramos na fé, para a nossa salvação” (cf 10, 32-39). E também convida a olhar para o exemplo dos grandes da Antiga Aliança (cf 11,1-40), como Abraão, Jacó, José, Moisés e uma verdadeira “nuvem de testemunhas” (12,1), que ficaram firmes na fé, “como se vissem o invisível” (cf 11,27).
E a conclusão: Portanto, coragem, meus irmãos, e não se deixem cair no desânimo (12,12). “Corramos com perseverança no certame que nos é proposto, com os olhos fixos em Jesus, que vai à frente da nossa fé e a leva à perfeição” (cf 12, 1-2). Não deixem de escutar a voz do Senhor, progridam na prática do bem e da partilha e no caminho da santidade, perseverem no amor fraterno, não se desviem da reta doutrina e orem com insistência. Deus é fiel e ajudará a realizar o que lhe é agradável (cf 12,25-13,1-21). Este texto da Palavra de Deus nos é dirigido no início do nosso ano pastoral. Portanto, coragem, meus irmãos, como discípulos e missionários na grande cidade de São Paulo, continuemos firmes, com os olhos fixos em Jesus Cristo!