Jesus sentou-se com os pecadores

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18/05/2016 - 14:30

No Evangelho segundo São Lucas, encontramos o texto que narra a presença de Jesus na Sinagoga de Cafarnaum. Ele, tomando o Livro do Profeta Isaías, fez a leitura de um trecho e parou no ponto que anunciava o “ano da graça do Senhor” (cf. Lc 4,19). O anúncio do ano da graça é também o anúncio da misericórdia de Deus. A misericórdia é a maneira como Deus age para chegar aos que estão subjugados pelo pecado.

Da criação à redenção, todo o agir de Deus é marcado pela misericórdia. Por diversas vezes, encontramos passagens do Evangelho que falam do agir misericordioso de Jesus, que acolhia os pecadores públicos. Seus gestos são claros e mostram que ele não se limitava a um simples contato superficial.

Jesus se sentava com os pecadores, comia com eles, tocava em suas feridas e perdoava seus pecados. A presença de Jesus, mais que um contato social, era um convite à conversão. Compreender a ação de Jesus como convite à conversão é fundamental para não entender, de forma equivocada, a presença de Jesus entre os pecadores.

Algumas vezes, se pretende justificar erros e enganos a partir da presença de Jesus entre os pecadores. É importante distinguir que essa presença não é aceitação passiva de ideologias, mas é antes convite à transformação, à mudança de uma realidade para outra.

Jesus entra na realidade do pecador para, então, conduzi-lo em outra direção. Jesus é o Caminho, que convida a sair. A sua misericórdia é transformadora para além da paralisia do pecado e da morte.

Jesus é a Verdade, que não se confunde com as “verdades subjetivas”. Por isso, para não confrontar-se com essa Verdade, parece mais fácil simplesmente desconsiderar algumas passagens do Evangelho, dizendo de forma parcial que, “Jesus se sentou com os pecadores”.

Jesus é a Luz que ilumina a escuridão. A escuridão hoje assume muitas formas. Ela se disfarça em alegria, em prazer, em amor. Assume a forma de estruturas, dentro da família, nos meios de comunicação, na política e em tantas outras realidades. A luz que é Jesus precisa iluminar tudo isso. A luz faz aparecer o contraste com a escuridão e deixa ver a verdade, que aponta o caminho. Por isso, Jesus sentou-se com os pecadores.

Não podemos confundir a misericórdia de Jesus como uma aceitação passiva de erros e enganos que conduzem ao pecado. O “tempo da Graça” é o tempo da misericórdia, que por sua vez deve suscitar adesão e compromisso com o Reino, da parte de quem ouve a pregação. Jesus se senta com os pecadores, mas não para simplesmente permanecer sentado.

Se lemos com atenção as passagens que narram o encontro de Jesus com os pecadores, percebemos que existe claramente uma mudança de atitudes. Podemos destacar dois casos particulares: o de Zaqueu (cf. Lc 19, 1-10) e o da mulher conhecida apenas como “adúltera” (cf. Jo 8, 1-11).

No primeiro caso, Zaqueu é atraído para ver Jesus, que depois tomou a iniciativa de entrar na casa desse pecador público. Essa visita causou espanto e rejeição da parte dos sacerdotes e religiosos, mas de outra parte provocou a conversão e a mudança na atitude de Zaqueu. A pregação de Jesus levou a uma revisão de vida, e consequentemente à mudança concreta, com atitudes.

A “adúltera” foi conduzida à presença de Jesus depois de ser surpreendida em pecado. Aqueles que a conduziram esperavam, da parte de Jesus, uma condenação, segundo a Lei.                       Jesus surpreendeu a todos com uma atitude de quase indiferença, escrevendo na terra. Mas, com palavras bastante claras, respondeu: “Quem não tiver pecado, atire a primeira pedra”. Nas palavras de Jesus, encontramos a coragem de enfrentar a realidade do pecado, mas preservar a pessoa. Não estamos imunes ao pecado, sabemos disso, e reconhecer isso é sinal de sabedoria. Também não basta saber e calar. Caída por terra, a “adúltera” confessa o pecado e recebe uma palavra de consolo para retomar a vida, agora livre do pecado: “Vai e não peques mais”.

A presença de Jesus, entre os pecadores, é um julgamento do pecado, e não da pessoa. Jesus se senta como juiz daquilo que desfigura a pessoa humana, que é o pecado, e sua palavra tem como finalidade o resgate da dignidade e da vida. Apropriar-se da ação de Jesus para justificar ideologias, de qualquer natureza, é falsificar grosseiramente o anúncio do Reino e a misericórdia de Deus.

Tenhamos sempre presente que o compromisso de Jesus é com a vontade do Pai e com o Reino, e que esse compromisso se confirma no mistério da cruz. Exatamente por isso, não se pode pendurar na cruz bandeiras com propostas opostas aos valores do Reino. A cruz não é um palco de debates, ela é sinal do compromisso de Deus com toda a humanidade, marcada pelo pecado, mas redimida pelo sangue derramado.

Ao sentar-se com os pecadores, Jesus indica sua disposição em acolher a todos, sem distinção, sem discriminação (cf. Misericordiae Vultus, 1). Ele é o rosto da misericórdia do Pai oferecida para cada pessoa, que suscita ternura, compaixão, indulgência, conversão e perdão, para uma vida nova.