O Deus da Paz

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09/11/2016 - 12:30

Você deseja a paz? A paz é possível sem você? Que relação há entre você e a paz? A paz é mais do que um dom de Deus para o ser humano; ela é mais do que um projeto humano desejado pelas pessoas.

Ela é, primeiramente, um atributo essencial do próprio Deus: Ele é o Deus da Paz. Paz não é somente uma qualidade acrescentada a Deus, mas constitui a sua própria natureza divina: ser Deus é o mesmo que ser Paz.

Toda a humanidade e toda a natureza anseiam e desejam ardentemente a paz, porque, no final das contas, toda a Criação é um reflexo do próprio Deus da Paz.

Em Deus, a paz constitui a sua própria natureza; e, na humanidade, a paz é um reflexo da glória de Deus impressa pelo Criador na criatura. Nós, enquanto criaturas do Deus da Paz, trazemos impressas as marcas de sua mão no barro do nosso ser: fomos criados para a paz e não para a guerra.

Na revelação bíblica, a paz é muito mais do que a simples ausência de guerra: ela representa a plenitude da vida. Longe de ser apenas uma construção humana, é dom divino precioso oferecido a todas as pessoas, o que inclui a obediência ao plano de Deus. Plano esse que corresponde à natureza de Deus e à natureza humana: trata-se de um plano, de um desígnio e de uma vontade de plenitude, não de penúria; de felicidade, não de tristeza; de harmonia, não de desordem; de paz, não de violência. Às vezes, falar de obediência ao plano de Deus provoca um sentimento de revolta: obedecer a Deus parece ser uma negação da liberdade e da autonomia humana. Na verdade, a obediência à vontade do Pai que se re- velou em seu Filho Jesus Cristo é a verdadeira liberdade que constrói a paz.

A promessa da paz percorre todas as páginas da Bíblia. O dom da paz é o testamento espiritual de Jesus: “Eu vos dou a paz, dou-vos minha paz. Não vo-la dou como o mundo dá” (Jo 14,27).

A paz é reconciliação com os irmãos e irmãs. Jesus ensinou na oração do Pai-nosso associar o pedido de perdão a Deus ao perdão oferecido aos irmãos. “Perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”. Com essa dupla reconciliação, o cristão pode se tornar artífice da paz e, portanto, ser obediente a Deus.

A paz e a violência não podem habitar na mesma morada: onde há violência, Deus não pode estar. Onde há violência, o ser humano não se sente em casa. Por isso, Jesus proclama: “Bem-aventurados os promotores da paz, porque serão chamados filhos de Deus”.

A paz é fruto da justiça e do amor. Da justiça, porque ela está em perigo quando ao ser humano não lhe é reconhecido o que lhe é devido enquanto ser humano, quando não é respeitada a sua dignidade, quando a convivência não é orientada em direção ao bem comum. Para a construção de uma cultura da paz e de uma sociedade pacífica, são essenciais a defesa e a promoção dos direitos humanos.

A paz é fruto do amor, porque a função da justiça é remover os obstáculos para a paz: o dano e a ofensa. Mas a plenitude da paz é ato próprio e específico do amor.

Justiça e amor nunca estão desvinculados na construção da paz. A justiça é a medida mínima do amor, e o amor leva à plenitude a própria justiça. É isso o que nos ensina o salmo, quando promete: “A bondade e a fidelidade outra vez se unirão, a justiça e a paz se abraçarão” (Sl 84,11).


Dom Julio Endi Akamine
Bispo auxiliar da Arquidiocese na Região Lapa;
nomeado arcebispo de Sorocaba (SP)


Artigo publicado no Jornal O SÃO PAULO - edição 3127 - 9 a 15 de novembro