Tempo Comum: “O nosso coração está em Deus!”

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01/07/2014 - 00:00

“Te amo de todo o meu coração!” ou “Te agradeço de todo coração”, dizem muitas vezes as pessoas que se amam e aquelas que são agradecidas; que bom se as pessoas soubessem expressar sempre mais o amor e a gratidão! Ao dizerem de coração estão afirmando que são autênticos e profundos o amor e a gratidão que sentem. E isso sem considerar os inúmeros “Aguenta… coração”, ditos durante os jogos do Brasil!

A Bíblia, em muitas passagens, se refere ao coração. Ela o apresenta como centro e fonte: centro das emoções, como por exemplo, alegria (Pr 15,13; At 2,26), angústia (Sl 25,17; Jr, 23,9), medo (Dt 28,67; Sl 27,3), amor (2Cor 6,11; 7,3), coragem (Sl 31,25); fonte de pensamentos, dos desejos e das ações das pessoas (Dt 15,9; Mc 7,21-23; Lc 6,45). Ser obstinado indica um coração duro (Ex 7,14; Jr 3,17), daí a necessidade de mudar o coração de pedra por um coração de carne (Ez 36,26), de converter-se de todo o coração (Jl  2,12-13), de perdoar o irmão de todo o coração (Mt 18,35) e, acima de tudo, de amar a Deus de todo o coração (Dt 6,5; Mt 22,37; Mc 12,13; Lc 10,27). Nesse contexto, pode-se compreender melhor a súplica do salmista: “Meu sacrifício é um espírito contrito. Um coração contrito e esmagado tu não o desprezas…  Ó Deus, cria em mim um coração puro, e renova no meu peito um espírito firme… Tu amas o coração sincero, e, no íntimo, me ensinas a sabedoria. (Sl 51,8.12.19).

A liturgia, por sua vez, na semana passada, dias 27 e 28, nos ofereceu a possibilidade de considerar essa característica da espiritualidade, dentro do Tempo Comum: o coração. Celebramos, respectivamente, a solenidade do Sagrado Coração de Jesus e a memória do Imaculado Coração de Maria. Cristo se apresenta como modelo para seus discípulos, por ser manso e humilde de coração (Mt 11,29); e Maria, Mãe de Deus e nossa e imagem da Igreja, foi apresentada como exemplo de pessoa que medita e guarda no coração o mistério de Jesus Cristo (Lc 2,19.51). Ela tornou-se o protótipo de quem escuta a Palavra de Deus e faz dessa Palavra o seu tesouro. Com Maria aprendemos a descobrir, por meio de meditação profunda, a atualidade da mensagem divina, atentos aos sinais dos tempos, isto é, ao que Deus vai realizando na história por trás das aparências da normalidade; em uma palavra, quer dizer refletir, como Maria, sobre os acontecimentos da vida quotidiana, tirando destes, como ela o fazia, conclusões de fé.

Contudo, os profetas no Antigo Testamento e, depois, Jesus, denunciaram uma incoerência de vida, quando a fé celebrada não era traduzida em ações: “Esse povo me honra com os lábios, mas seu coração está longe de mim” (Mt 15,8). Tal separação entre fé e vida pode ser vencida bebendo da fonte da liturgia; de fato, no diálogo inicial da Oração Eucarística, nos é proposto sempre de novo e sinteticamente o ideal de vida de comunhão com Deus, assim explicitado: “Corações ao alto – O nosso coração está em Deus”; é assumir hoje a exortação do profeta Joel: “Pois agora – oráculo do Senhor – voltem para mim de todo o coração… Voltem para o Senhor, o Deus de vocês, pois ele é piedade e compaixão, lento para a cólera e cheio de amor” (2,12-13) Esse é um ideal a ser retomado, buscado cotidianamente, como elemento de nossa espiritualidade inspirada na liturgia do Tempo Comum.

+ Edmar Peron,
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de São Paulo
Vigário Episcopal para a Região Belém