‘O amor que sempre nos uniu deve preparar a solidariedade que torna mais justa e mais fraterna a convivência do povo de São Paulo’

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Às vésperas de deixar o comando da Arquidiocese em 22 de maio de 1998, Dom Paulo Evaristo Arns expressou seu agradecimento a todos que o apoiaram nos 28 anos como arcebispo
Publicado em: 08/12/2016 - 18:45
Créditos: Jornal O SÃO PAULO

Às vésperas de deixar o comando da Arquidiocese de São Paulo, em 22 de maio de 1998, Dom Paulo Evaristo Arns expressou seu agradecimento a todos que o apoiaram nos 28 anos à frente da Igreja em São Paulo, por meio do texto a seguir, publicada na coluna “Encontro com o Pastor”, na edição do O SÃO PAULO de 13 de maio de 1998.

“Aos amigos de São Paulo”

Meus amigos, católicos, cristãos, homens que buscam a Deus e que seguem sua consciência na procura da verdade e do bem:

Às vésperas de deixar o cargo de arcebispo metropolitano de São Paulo, desejo expressar o mais profundo afeto e gratidão a todo o povo, a seus padres, seminaristas, religiosos, consagrados, e aos bispos, por terem alimentado minha esperança quotidianamente nesses 27 anos, 5 meses e 23 dias de luta comum.

Prezados amigos, meu primeiro pedido é o de darmos todo o afeto e ajuda aos que mais sofrem. Nesses longos anos, tivemos muitos encontros que nos fortaleceram mutuamente. O povo todo esteve sempre diante de nossos olhos e bem dentro do coração. O povo da rua que o diga, neste momento. Nem uma só vez fui recebido por ele com indiferença, embora não lhe pudesse dar tudo o que desejava.

Quero dizer-lhes de coração: continuem a formar seus núcleos, a fim de buscar alternativas para a subsistência material e o conforto espiritual. A Casa de Oração do bairro da Luz aí está, para acolhê-los.

À classe média e a todos que possuem mais recursos, lembro o que tantas vezes comentamos: NÃO PODEMOS VIVER COMO INDIVÍDUOS, mas temos que assumir a dignidade e a missão de pessoas que vivem para a sua família, mas também para todo o povo. Só assim atingiremos as queridíssimas crianças e restituiremos aos jovens a sua esperança.

A todos os cristãos, sem distinção de classe, transmito nesta hora a palavra mais sentida de gratidão e amizade. Apoiamo-nos mutuamente e foi neste sentido que eu me considerei pastor desta cidade, designado por Cristo, que supre as nossas deficiências e aceita os nossos pedidos.

Aos religiosos e demais consagrados, devo a graça de me abrirem o caminho para o coração do povo. Foram eles que possibilitaram o contato com os grupos que mais sofrem e por vezes até com povos mais distantes que se interessam pelo Brasil. Eles souberam o que significa amar. Se pudermos dar-lhes um conselho, nesta última palavra oficial, diremos que cultivem o seu carisma e os seus talentos, porque assim cumpriremos a missão evangélica e nos tornaremos instrumentos do plano divino.

Foi o Criador que nos deu olhos e os demais sentidos, para descobrirmos a alegria e a esperança daqueles que ajudam os mais sofridos, particularmente aqueles que são vítimas das drogas e da violência. Continuem a ter o povo no coração, cada vez que se encontram com Deus em suas preces e em seus trabalhos insubstituíveis.

Aos meus caríssimos padres, que poderia dizer? Impressionou-me a afirmação do Concílio, cujos textos eu fui incumbido de traduzir, em grande parte, para nossa limbra. Foi o Espírito Santo quem me trouxe a São Paulo e nos transformou em um só corpo para ação em favor do povo. A “porção do povo de Deus” junto com os seus bispos constitui o sentido de toda a nossa existência.

Foi no Estado de São Paulo que fiz os meus três anos de experiência após os anos de estudos rigorosos no país e no exterior. Não imaginava, naquele tempo, que Deus me concedesse a graça que considero insuperável, de ordenar 284 padres e 19 bispos, justamente por ser arcebispo de São Paulo. Os senhores bispos auxiliares, sempre tão unidos à minha pessoa e ação, ampliaram esse número que, hoje, constitui a esperança para o futuro.

A cada um dos padres de nossa Igreja, devo reafirmar que a minha vida lhes pertence, porque foi Deus mesmo que nos uniu pelo Espírito Santo para a obra de Cristo. Aos sacerdotes mais idosos, pra quem construímos o lar Casa São Paulo”, desejo neste momento exprimir minha admiração, por me terem acolhido com tanta espontaneidade na hora em que o papa Paulo VI me designou para pastor desta cidade, quando me sentia desprevenido e despreparado para tanto.

Permitam-me, os meus irmãos presbíteros, que lhes deixe como lembrança e advertência um desejo muito simples, profundamente arraigado em meu espírito: amem este povo, rezem por ele, leiam muito, para acompanhar os tempos e evangelizar com ardor, muito unidos ao queridíssimo papa João Paulo II.

Os bispos regionais sabem que formávamos e formaremos para sempre um colégio de apóstolos unidos a Cristo, guiados pelo Espírito Santo para cumprir o plano do Pai.

Meus amigos: cada palavra que brota de meu coração, neste momento, é inspirada e ungida pelo Espírito de Deus. O amor que sempre nos uniu deve preparar a solidariedade que torna mais justa e mais fraterna a convivência do povo de São Paulo.

PAI NOSSO...”

Publicado no Jornal O SÃO PAULO em 13 de maio de 1998

Especial Dom Paulo Evaristo Arns