Páscoa, com sangue de mártires

A A
30/03/2016 - 10:00

Páscoa no Ano Santo da Misericórdia, uma ocasião especialíssima para recordar e anunciar a todo mundo que Deus “tanto amou o mundo, que lhe entregou seu Filho único, para que não morra para sempre todo aquele que nele crer, mas tenha a vida eterna” (cf. Jo 3, 16-17). Jesus Cristo crucificado estendeu seu amor e perdão a todos, mesmo àqueles que o condenavam à morte e pregavam na cruz: “Pai, perdoai-lhes, não sabem o que fazem” (cf. Lc 23,34).

A Páscoa traz alegria e o renascer da esperança para os desiludidos e desanimados; a paz e um caminho luminoso para quem se deixa encontrar pelo Ressuscitado, que deseja estar ao nosso lado e caminhar em nossa companhia pelas estradas da vida, “aquecendo nossos corações pelo caminho” (cf. Lc 24,32). Após a ressurreição, Jesus não reuniu as suas “tropas” para combater os inimigos ou para se vingar daqueles que o prenderam, torturaram e condenaram à morte injusta. Sua saudação é de paz para todos: “a paz esteja com vocês!” (cf. Jo 20, 19-21). E mandou dar o perdão a todos os que o aceitarem (cf. Jo 20,23).

Infelizmente, a celebração da Páscoa deste ano não foi tão pacífica e serena pelo mundo afora e aqui mesmo no Brasil. Atentados em vários países, com muitas mortes, mancharam de sangue inocente mais uma vez a celebração da Paixão de Cristo; numerosos mártires cristãos deram sua vida, também nesta Páscoa, em testemunho de Cristo ressuscitado e glorificado, esperança de vida para todos.

Causou especial impacto o terrível ataque com bomba num parque cheio de gente em Lahore, no Paquistão, onde um grupo de cristãos festejava a Páscoa. Um “homem-bomba” se explodiu no meio da multidão. Naquele País, os cristãos e católicos são uma minoria perseguida pelos grupos islâmicos radicais; diversos já foram os ataques nos anos recentes, com grande número de mortos e destruição de igrejas. Também dessa vez, ao assumir a responsabilidade do ataque, o grupo favorável aos talibãs afirmou que o objetivo era a minoria cristã do País. O ataque matou ao menos 72 pessoas e feriu outras 352; vários feridos estão em estado grave. Dos mortos, dez são cristãos e os demais são muçulmanos. As crianças mortas são 18. A cidade de Lahore está no foco da guerra civil contra os talibãs, sendo um reduto político do atual chefe de governo do Paquistão.

O Papa Francisco, na sua mensagem e bênção de Páscoa “urbi et orbi”, solidarizou-se com o povo paquistanês e rezou pelas vítimas e as famílias atingidas; qualificou o ataque como uma tragédia horrível, que lança uma sombra de tristeza e de angústia sobre a festa da Páscoa. “Mais uma vez, o ódio homicida se lança de maneira vil contra as pessoas mais indefesas”. Ao mesmo tempo, Francisco desejou que o Senhor crucificado por nós e ressuscitado continue a nos dar a coragem e a esperança necessárias para construir caminhos de compaixão, de solidariedade com os que sofrem, de diálogo, de justiça, de reconciliação e de paz.

Vários outros atentados aconteceram recentemente, visando cristãos em vários países. Há poucas semanas, quatro religiosas Missionárias da Caridade, da Beata Teresa de Calcutá, foram assassinadas por um extremista islâmico no Iêmen, onde prestavam serviços de assistência aos mais pobres dentre os pobres, num contexto todo muçulmano. O Padre Thomas Uzunnalil, salesiano da Índia, que as assistia, foi sequestrado e também está ameaçado de morte. O sangue dos mártires testemunha a fé em Cristo crucificado e ressuscitado. É preciso lembrar que a última palavra não pertence ao ódio e à violência, mas ao perdão e à misericórdia.

Os fatos de violência cega e irracional deveriam ser um alerta também para nós, aqui no Brasil: o incitamento ao ódio, ao preconceito e à discriminação pode levar a atos violentos e insanos. A grave responsabilidade de tais atos não é só dos seus autores, mas também daqueles que incitam ao ódio e à violência.

Publicado no jornal O SÃO PAULO - Edição 3095 - 30 de março a 5 de abril de 2016