Sem nunca se cansar

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10/08/2016 - 16:45

Durante a audiência geral de quarta-feira o Papa Francisco falou sobre a necessidade de rezar sempre

Na vida diária “não se trata de rezar às vezes, quando tenho vontade. Não! Jesus diz que é necessário ‘orar sempre, sem nunca se cansar’”, recordou o Papa na audiência geral de quarta-feira 25 de maio de 2016, na praça de São Pedro. Dando continuidade às reflexões sobre o tema jubilar à luz do Evangelho, Francisco comentou a parábola do juiz e da viúva narrada em Lucas (18,1-8) para falar da oração como fonte de misericórdia.

Bom dia, caros irmãos e irmãs!

A parábola evangélica que há pouco ouvimos (cf. Lc 18, 1-8) contém um ensinamento importante: “A necessidade de orar sempre, sem nunca se cansar” (v. 1). Portanto, não se trata de rezar às vezes, quando tenho vontade. Não! Jesus diz que é preciso “orar sempre, sem se cansar”. E cita o exemplo da viúva e do juiz.

O juiz é uma personalidade poderosa, chamada a emitir sentenças com base na Lei de Moisés. Por isso, a tradição bíblica recomendava que os juízes fossem pessoas tementes a Deus, dignas de fé, imparciais e incorruptíveis (cf. Êx 18, 21). Ao contrário, este juiz “não temia a Deus, nem respeitava pessoa alguma” (v. 2). Era um juiz iníquo, sem escrúpulos, que não tinha em consideração a Lei mas fazia o que queria, segundo o próprio interesse. Uma viúva vai ter com ele para obter justiça. As viúvas, juntamente com os órfãos e com os estrangeiros, eram as categorias mais frágeis da sociedade. Os direitos que lhes eram assegurados pela Lei podiam ser espezinhados com facilidade porque, dado que eram pessoas sós e indefesas, dificilmente podiam fazer-se valer: uma pobre viúva, ali sozinha, ninguém a defendia, podiam ignorá-la, sem lhe fazer justiça. Do mesmo modo também o órfão, o estrangeiro, o migrante: naquela época esta problemática era muito acentuada. Diante da indiferença do juiz, a viúva recorre à sua única arma: continuar insistentemente a importuná-lo, apresentando-lhe o seu pedido de justiça. E é precisamente com esta perseverança que ela alcança a sua finalidade. Com efeito, numa certa altura o juiz atende-a, mas não porque é impelido pela misericórdia, nem porque a consciência lho impõe; ele simplesmente admite: “Dado que esta viúva me importuna, far-lhe-ei justiça, senão ela não cessará de me molestar” (v. 5).

Desta parábola Jesus haure uma dupla conclusão: se a viúva conseguiu convencer o juiz desonesto com os seus pedidos insistentes, tanto mais Deus, que é Pai bom e justo, “fará justiça aos seus escolhidos, que clamam por Ele dia e noite”; e além disso, não os “fará esperar muito tempo”, mas agirá “imediatamente” (vv. 7-8).

Por isso Jesus exorta a rezar “sem se cansar”. Todos nós sentimos momentos de cansaço e de desânimo, sobretudo quando a nossa oração parece ineficaz. Mas Jesus tranquiliza-nos: diversamente do juiz desonesto, Deus atende os seus filhos de modo imediato, embora isto não signifique que o faça segundo os tempos e modos que nós gostaríamos. A oração não é uma varinha mágica! Ela ajuda a conservar a fé em Deus, a confiar em Deus até quando não compreendemos a sua vontade. Nisto, o próprio Jesus - que rezava muito! - serve-nos de exemplo. A Carta aos Hebreus recorda que “nos dias da sua vida mortal, [Ele] dirigiu preces e súplicas, entre clamores e lágrimas, àquele que o podia salvar da morte, e foi atendido pela sua piedade” (5, 7). À primeira vista esta afirmação parece improvável, porque Jesus morreu na cruz. E no entanto a Carta aos Hebreus não se engana: Deus salvou verdadeiramente Jesus da morte, vencendo-a com uma vitória completa, mas o caminho que teve de percorrer para a alcançar passou através da própria morte! A referência à súplica que Deus atendeu remete para a oração de Jesus no Getsémani. Tomado pela angústia incumbente, Jesus reza ao Pai para que o livre do cálice amargo da paixão, mas a sua prece está permeada de confiança no Pai e Ele entrega-se incondicionalmente à sua vontade: “Contudo - diz Jesus - não se faça o que Eu quero, mas sim o que Tu queres” (Mt 26, 39). O objeto da oração passa para segundo plano; o que importa antes de tudo é a relação com o Pai. Eis o que faz a oração: transforma o desejo, modelando-o segundo a vontade de Deus, qualquer que ela seja, porque quem ora aspira em primeiro lugar à união com Deus, que é Amor misericordioso.

A parábola conclui-se com uma pergunta: “Mas quando vier o Filho do Homem, acaso encontrará fé sobre a terra?” (v. 8). E com esta interrogação estamos todos alertados: não devemos desistir da oração, mesmo que não seja correspondida. É a prece que preserva a fé, pois sem ela a fé vacila! Peçamos ao Senhor uma fé que se faz oração incessante, perseverante, como a da viúva da parábola, uma fé que se alimenta do desejo da sua vinda. E na prece experimentamos a compaixão de Deus que, como um Pai, vem ao encontro dos seus filhos cheio de amor misericordioso.

Fonte: Edição nº 21 do Jornal L’OSSERVATORE ROMANO – página 16