A Igreja na metrópole - Dom Odilo Pedro Scherer

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Publicado em: 05/12/2014 - 17:00
Créditos: Edição nº 3030 a do Jornal O SÃO PAULO – página 03

De 24 a 26 de novembro, realizou-se em Barcelona, na Espanha, um Congresso de bispos de grandes metrópoles do mundo; participaram os arcebispos de Barcelona, Madri, Lisboa, Lyon, Bordeaux, Zagreb (Croácia), Nápoles, Saigon, Mumbai (Índia), Seul, Kinshasa (Congo), Abuja (Nigéria), Douala (Camarões), São Paulo, Rio de Janeiro, Buenos Aires, Santiago, Monterrey e São Francisco (Estados Unidos). Também participou o Vigário de Roma, Cardeal Agostino Vallini.

As reflexões tinham como tema - “Deus vive na cidade”. De fato, essa foi a segunda etapa de uma iniciativa, que também contou com um simpósio de sociólogos e pastoralistas, em maio passado, igualmente em Barcelona. Ao todo, esses pastores de metrópoles têm na sua responsabilidade um rebanho de mais de 200 milhões de pessoas! No dia 27, o Papa Francisco recebeu em audiência, no Vaticano, os participantes do Congresso.

As grandes metrópoles requerem uma urgente atenção pastoral; nelas joga-se o futuro da humanidade e também da Igreja. Quase a metade da população mundial já é urbana; no Brasil, já chega perto dos 80%. Não dá mais para imaginar o mundo sem as grandes cidades; pelo contrário, elas crescerão em número e em extensão nos próximos anos.

Para a Igreja, a cidade é seu campo de ação natural. Afirmar que “Deus vive na cidade” é mais que uma expressão poética ou retórica. Faz parte de nossa fé que Deus ama as pessoas onde quer que elas estejam e deseja que tenham vida plena. E Jesus enviou os apóstolos “a todo o mundo”, para proclamar o Evangelho a toda criatura! Os habitantes das metrópoles não poderiam ser excluídos desse mandato universal.

As grandes cidades crescem aceleradamente, sobretudo nos países em vias de desenvolvimento, por causa das migrações e do êxodo rural; esse fenômeno acarreta, geralmente, todo tipo de degrado social e moral, por causa da falta de infraestrutura urbana e de condições adequadas para a vida digna de tantas pessoas. A própria Igreja enfrenta desafios imensos para oferecer acolhida e serviços de evangelização e assistência religiosa a tantas pessoas.

O Papa Francisco disse aos participantes do Congresso que o desafio das metrópoles requer uma “mudança de mentalidade pastoral”; a Igreja não é mais a única referência cultural para as pessoas. Não é que devamos deixar-nos levar por um relativismo pastoral, perdendo a referência no Evangelho: “É preciso ter a coragem de uma pastoral evangelizadora audaz e sem temores” para apresentar Jesus e o Evangelho ao homem e à mulher da cidade grande.

É necessário o “diálogo com a multiculturalidade”, sem perder a própria identidade. Para tanto, é necessário conhecer a fundo o fenômeno urbano, seus imaginários coletivos as “cidades invisíveis” e suas linguagens, para encontrar o coração do homem urbano e oferecer-lhe o Evangelho da vida.

Elemento importante para a evangelização da cidade é a religiosidade do povo: se Deus habita a cidade, é necessário buscá-lo e reconhecê-lo onde Ele está e se manifesta, nas situações da vida urbana. Um bispo observou, durante o Congresso, que em sua diocese “metropolitana” foi assumido o propósito de prestar atenção aos “vigários de Cristo” na cidade e de ir ao seu encontro: os pobres, os doentes, os prisioneiros, os moradores de rua, os imigrados…

Francisco observou que o desafio da Igreja em relação aos pobres e rejeitados das metrópoles é duplo: acolhê-los com caridade e valorizar a sua fé, tantas vezes simples e até mesclada com elementos mágicos, mas deve ser valorizada, discernida e evangelizada.

A transformação da Igreja nas metrópoles requer “pensar tudo em termos de missão”, observou o Papa: sair, ir ao encontro em vez de esperar que as pessoas venham, adequar-se ao ritmo da cidade e inserir-se nele: horários de celebrações e atendimentos adequados às possibilidades do povo, igrejas de portas abertas, testemunho vigoroso da fé, incidência na cultura urbana, ir às periferias geográficas, humanas, sociais e existenciais, pastoral ecumênica, participação efetiva dos leigos na missão da Igreja.

O Deus que vive na cidade pede que a Igreja de Cristo se coloque ao serviço do seu reino com novo dinamismo e criatividade pastoral.

Cardeal Dom Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo

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