Expressão da Vida: Carne e Sangue - Raul de Amorim

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15/04/2016 - 00:15

Jo. 6,52-59

Quem lê o evangelho de João superficialmente pode ficar com a impressão de que o evangelista repete sempre a mesma coisa. Lendo com mais atenção ou “mergulhando no texto, perceberá que não se trata de repetição. O quarto evangelho tem um jeito próprio de repetir o mesmo assunto, mas é num nível cada vez mais alto e profundo. É como fazer uma tomografia computadorizada... Assim é o discurso sobre o Pão da Vida.

Jo.6,52-58: “Os judeus começaram a discutir entre si... Como esse homem pode dar-nos sua carne para comer?  Apesar o mal entendido por parte do povo, Jesus não se corrige, mas acrescenta: “Se vocês não comem a carne do Filho do Homem e não bebem o seu sangue, não têm a vida em vocês” (Jo.6,53)  Eles não entenderam as palavras de Jesus, porque tomaram tudo ao pé da letra. Para ajudar é bom lembrar que no início deste capítulo o evangelista nos diz: “Estava próxima a Páscoa, a festa dos judeus” (Jo.6,4) Dentro de poucos dias , todos iam comer o cordeiro pascal. O que está por traz dessas palavras de Jesus?

Comer a carne de Jesus significava aceitá-lo como novo Cordeiro Pascal, cujo sangue os libertaria da escravidão. Beber o sangue de Jesus significava assimilar a mesma maneira de viver que marcou a vida dele. Sangue era o sinal da vida. O sinal dos pães e peixes partilhados anteriormente teria que alcançar sentido cada vez mais profundo e desafiador: o próprio Jesus pode apresentar-se a si mesmo como alimento de vida.

Jesus afirma que quem come sua carne e bebe o seu sangue entra em tal comunhão com Ele só comparável à comunhão de Jesus com o Pai!   Essas palavras fazem lembrar o apóstolo Paulo por ocasião da sua conversão: “E, caindo por terra, ouviu uma voz que lhe dizia: Saulo, Saulo, porque você me persegue?” Ele perguntou: “Quem és tu, Senhor?” E a resposta: “Eu sou Jesus, a quem você persegue... (At.9,4-5) Paulo perseguia cristãos.

 Aqui temos a resposta do ensinamento de Jesus: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu permaneço nele” (Jo.6,56). Na carta aos Gálatas, Paulo expressa a comunhão íntima com Jesus: “E já não sou eu que vivo; é Cristo que vive em mim. E a vida que vivo agora na carne, eu a vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou a si mesmo, por mim”. (Gl. 2,20)  Paulo entendeu as palavras de Jesus...

Jo. 6,59: “Jesus disse essas coisas quando ensinava na sinagoga de Cafarnaum...” Termina assim o Discurso do Pão da Vida. Os questionamentos do povo e dos judeus refletem as dificuldades dos membros das primeiras comunidades. As respostas de Jesus são esclarecimentos para ajudar as comunidades daquele tempo e as de hoje a superar as dificuldades, e aprofundar a fé na Eucaristia. Foi o compromisso dele com a vida concreta das pessoas que o levou ao dom radical: a oferta de sua carne e sangue. Fortificada dessa maneira com Jesus, Palavra de Deus feita carne, a comunidade pode comprometer-se com a vida que Ele veio trazer ao mundo.

Termino a meditação me questionando: Mesmo não podendo ir à missa todos os dias ou todos os domingos, minha vida deve ser eucarística. Como realizar este objetivo?