O patrimônio artístico e cultural está a serviço da missão da igreja

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A programação do simpósio contou com conferências de especialistas de diferentes áreas
Publicado em: 01/09/2017 - 16:45
Créditos: Fernando Geronazzo

Luciney Martins/O SÃO PAULO

Com o objetivo de discutir sobre a preservação do patrimônio material e imaterial, cultural e artístico católico a partir do que institui o Acordo BrasilSanta Sé, a Fundação São Paulo, mantenedora da PUC-SP, e a Arquidiocese de São Paulo realizaram um simpósio nos dias 25 e 26, no Teatro Tuca, em Perdizes, na zona Oeste da Capital Paulista.

O evento teve a participação de mais de 500 pessoas, entre padres, bispos, seminaristas, arquitetos, artistas plásticos, restauradores e leigos de diversas partes do Brasil. A programação do simpósio contou com conferências de especialistas de diferentes áreas, que aprofundaram temas como a concepção de patrimônio artístico e cultural, a legislação que garante sua proteção, bem como as normativas para a aprovação de projetos de conservação e restauro e a captação de recursos junto a entidades de fomento cultural.

Na abertura do simpósio, o Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo de São Paulo, destacou que estão a serviço da vida e missão da Igreja todos os bens que ela possui, sejam eles culturais, artísticos, históricos, patrimoniais e até financeiros. “Por meio deles, a Igreja expressa suas convicções, sua maneira de ver o ser humano, a sua vida neste mundo, determinadas concepções sobre a sua fé. Expressa, portanto, o testemunho daquilo que é seu patrimônio de fé e espiritual”, disse.  

Acordo Brasil-Santa Sé

Promulgado em 11 de fevereiro de 2010, no acordo bilateral e internacional entre o Brasil e a Santa Sé estão vários elementos de interesse recíproco, como questões de educação, assistência à saúde, a preservação da liberdade religiosa e o reconhecimento das instituições eclesiais para que a Igreja possa se fazer presente na sociedade.  Entres esses elementos de interesse recíproco, há no acordo um artigo que trata da preservação do patrimônio histórico, artístico e cultural da Igreja Católica no Brasil.

Segundo Gianpaolo Poggio Smanio, Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, o Acordo Brasil-Santa Sé, ao ser promulgado, ingressou no sistema jurídico brasileiro, de modo que os termos desse acordo são considerados legislação brasileira, inclusive o que diz respeito à preservação do patrimônio.

No artigo 6º do Acordo, está previsto que “o patrimônio histórico, artístico e cultural da Igreja Católica, assim como os documentos custodiados nos seus arquivos e bibliotecas, constitui parte relevante do patrimônio cultural brasileiro”. Nesse sentido, o Estado brasileiro e a Santa Sé assumiram o compromisso de cooperação mútua para “salvaguardar, valorizar e promover o uso dos bens móveis e imóveis de propriedade da Igreja Católica ou de outras pessoas jurídicas eclesiásticas que sejam considerados pelo Brasil como parte de seu patrimônio cultural e artístico”.

Já no artigo 7º do Acordo, o Brasil assegura as medidas necessárias para garantir a proteção dos lugares de culto da Igreja Católica, de suas liturgias, símbolos, imagens, objetos de culto, contra toda forma de violação, desrespeito e uso ilegítimo. “Nenhum edifício, dependência ou objeto afeto ao culto católico pode ser demolido, ocupado, transportado, sujeito a obras ou destinado pelo Estado e entidades públicas a outro fim”, diz o texto Acordo.

 Ainda segundo o Procurador-Geral, a proteção assegurada pela lei ao patrimônio se dá pelo valor histórico, cultural e religioso do bem, independentemente de ser tombado ou não. 

O Caminho a percorrer

Quando uma comunidade pensa em fazer uma reforma ou restauro, a primeira coisa a ser verificada junto aos órgãos de preservação é se existe algum tipo de tombamento do imóvel. Em seguida, é feito um projeto de restauro, encaminhado aos órgãos de preservação e, depois, busca-se como viabilizar financeiramente a obra, se inscrevendo em programas de incentivo à cultura para captar recursos junto à iniciativa privada, por meio do incentivo da isenção fiscal.

No âmbito federal, existe a Lei de Incentivo à Cultura, mais conhecida como a Lei Rouanet, que concede a pessoas físicas e jurídicas incentivos fiscais para projetos e ações culturais. Na esfera estadual, existe o Programa de Ação Cultural (Proac), que oferece a empresas contribuintes do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (Icms) a oportunidade de patrocinar a produção artística e cultural de São Paulo, apoiando financeiramente projetos credenciados pela Secretaria de Estado da Cultura.

Padre José Roberto Pereira, Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Consolação, percorreu esse caminho para iniciar, há seis anos, o processo de restauro da igreja bicentenária na região central de São Paulo. Ele afirmou que, no início, a burocracia dificultou um pouco, pelo fato de uma parte do templo ser tombada. “Cuidamos primeiro daquilo que era emergencial, como o telhado, descupinização, toda a parte estrutural, para depois começarmos a parte artística. Para essas questões emergenciais, não pudemos esperar a liberação dos órgãos de proteção ao patrimônio. Mas, com a orientações do Departamento de Arquitetura da Mitra Arquidiocesana, nós conseguimos lidar com essas questões”, relatou.  

Conscientização

Para Dom Gregório Paixão, Bispo de Petrópolis (RJ) e membro da Comissão de Implementação do Acordo BrasilSanta Sé, é fundamental conscientizar as pessoas sobre a importância do Acordo e, ao mesmo tempo, gerar nas novas gerações de sacerdotes o olhar de admiração e a consciência da necessidade de preservar o patrimônio que pertence não apenas à Igreja Católica, mas a todo o Brasil.

Dom Gregório explicou ao O SÃO PAULO que quando se fala de patrimônio, é preciso ter claro que se trata tanto de bens materiais – igrejas, imagens, obras de arte, mobiliário e objetos sacros; quanto de bens imateriais – festas religiosas, procissões, músicas e até, por exemplo, o toque dos sinos das igrejas de Minas Gerais.

“Às vezes, a preservação não existe por falta de conhecimento. Alguns pensam que aquilo que é velho precisa ser substituído [...]. Queremos preservar o passado, mas também queremos continuar a produzir arte, que é fundamental para a educação das pessoas e de um país”, completou Dom Gregório.