Sínodo: relatório sintetiza principais assuntos debatidos por padres sinodais

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<p>Na primeira das três partes do Relatório, é apresentado um olhar sobre o contexto e os desafios da família nos âmbitos sociocultural, religioso e afetivo.</p>
Publicado em: 16/10/2014 - 16:45
Créditos: Jornal O SÃO PAULO – Edição 3023 - 15 a 21 de outubro de 2014

Por Fernando Geronazzo 

“Encontrar caminhos de verdade e misericórdia para todos” segundo uma abordagem que permita apreciar mais “os valores positivos do que os limites e carências”. Este é o objetivo do Sínodo dos Bispos, segundo o relator-geral, Cardeal Peter Erdö (foto), ao apresentar oRelatio post disceptationem na segunda-feira, 13.  Trata-se de um documento de trabalho que resume as intervenções e o debate da primeira semana do Sínodo, que agora continua seus debates em círculos menores.

Na primeira das três partes do Relatório, é apresentado um olhar sobre o contexto e os desafios da família nos âmbitos sociocultural, religioso e afetivo, tais como:

  • Realidades como o individualismo e a solidão, decorrentes das mudanças antropológicas e culturais, que requerem “uma abordagem analítica e diversificada, capaz de compreender as formas positivas de liberdade individual”.
  • Problemas como a precarização do trabalho e os altos impostos, considerados “um peso”, que muitas vezes não incentiva os jovens para o casamento.
  • Desafios particulares decorrentes de contextos culturais e religiosos, como a prática da poligamia em sociedades africanas, ou o matrimônio misto em países onde o catolicismo é minoria religiosa.
  • O crescimento da prática da coabitação antes do Matrimônio, e, em muitos casos, não havendo o interesse de um vínculo institucional. 
  • Os debates do Sínodo também trouxeram à tona a preocupação pastoral com as muitas crianças que nascem fora do casamento e crescem com apenas um dos pais ou em um “contexto de família alargada ou reconstituída”.
  • Sobre o crescente número de divórcios, o Relatório frisa que não é incomum que muitos casais tomem essa decisão “unicamente por fatores econômicos”. Sem contar quando as crianças são objeto de disputa entre os pais, sendo “as verdadeiras vítimas de dificuldades familiares”.
  • As condições das mulheres vítimas das muitas situações de violência no seio das famílias, ou mesmo a violência causada pela guerra, terrorismo ou crime organizado, também são constatados pelo Relatório como realidades em que se encontram famílias deterioradas.
  • A falta de maturidade afetiva é um desafio real para o crescimento dos casais. “Muitos são aqueles que tendem a permanecer nas primeiras fases da vida emocional e sexual. A crise do casal desestabiliza a família e pode levar à separação e ao divórcio a ter graves consequências para adultos, para crianças e para sociedade, enfraquecendo os laços individuais e sociais”.

Diante desse contexto, o Relatório afirma que “acolher as pessoas com a sua existência concreta, aprender a apoiar essa busca, incentivar o desejo de Deus e um desejo de se sentir totalmente parte da Igreja, mesmo aqueles que experimentaram falha ou é nas mais diversas situações”, e ainda acrescenta que “isto requer que a doutrina da fé, conhecida mais e mais em seus conteúdos fundamentais, seja proposta junto com a misericórdia”.

Perspectivas pastorais diante dos desafios da família

 

O Relatio post disceptationem destaca que o anúncio do Evangelho da família deve ser feito “com a ternura da mãe e a clareza mestra”, e lembra que “a verdade é incorporada na fragilidade humana não para condenar, mas para curá-la”. O texto ainda salienta  que o diálogo sinodal permitiu chegar a um consenso sobre algumas instâncias pastorais mais urgentes, apresentando algumas perspectivas pastorais.

Preparação para o Matrimônio

Os padres sinodais foram unânimes em sublinhar a necessidade de um maior envolvimento de toda a comunidade com foco no testemunho das próprias famílias, bem como uma base de preparação para o Matrimônio no caminho da Iniciação Cristã, enfatizando a relação do Matrimônio com os outros sacramentos.

Uniões civis e convivências

O Relatório propõe  “acolher a realidade positiva dos Matrimônios civis e, diferenças à parte, das convivências”, para acompanhar os casais na redescoberta do sacramento nupcial. “Mas o anúncio não pode ser meramente teórico e avulso dos problemas reais das pessoas”.

Nulidade matrimonial

O Relatio aponta ainda à necessidade de “tornar mais acessíveis e ágeis os procedimentos de reconhecimento da nulidade matrimonial”, de incrementar a responsabilidade dos bispos locais e instituir a figura de um sacerdote que, adequadamente preparado, possa aconselhar as pessoas.

Recasados

Também as situações de divorciados novamente casados exigem um cuidadoso discernimento e acompanhamento, evitando qualquer linguagem e atitude que faz com que se sintam discriminados.
Sobre possível acesso aos sacramentos da Penitência e da Eucaristia, foi sugerido que seja precedido por um caminho penitencial - sob a responsabilidade do bispo diocesano - e com um compromisso claro em favor dos filhos. “Esta seria uma oportunidade não generalizada, o resultado do discernimento implementa-do caso a caso, de acordo com uma lei da gradualidade, que leva em conta a distinção entre um estado de pecado, estado de graça e atenuantes”, diz o texto.

Acolhida de pessoas homossexuais

O Relatório apresenta a questão da homossexualidade como um “importante desafio educativo” e convida os católicos a se questionarem se são capazes de acolher estas pessoas, garantindo-lhes espaços de fraternidade em suas comunidades.

“A questão homossexual nos interpela em uma séria reflexão sobre como elaborar caminhos realistas de crescimento afetivo e de maturidade humana e evangélica integrando a dimensão sexual: se apresenta, portanto, como um importante desafio educativo. Sem negar as questões morais relativas às uniões homossexuais é reconhecido que há casos em que o apoio mútuo e até o sacrifício constitui um valioso apoio para a vida dos parceiros. Além disso, a Igreja tem uma atenção especial às crianças que vivem com casais do mesmo sexo, insistindo que em primeiro lugar deve sempre colocar as necessidades e direitos das crianças”.

Comentando esse ponto do Relatório, o secretário especial do Sínodo, Dom Bruno Forte, reforçou que a Igreja não partilha que a mesma terminologia “família” possa ser indiferentemente aplicada à união entre um homem e uma mulher, aberta à procriação, e à união homossexual. “Dito isso, parece-me evidente que as pessoas humanas envolvidas nas várias experiências têm direitos que devem ser tutelados. Portanto, o problema é, sobretudo, não a equiparação tout court (tal qual, sem mais), inclusive terminológica, mas naturalmente isso não quer dizer que é preciso então excluir a busca também de uma codificação de direitos que possam ser assegurados a pessoas que vivem em uniões homossexuais. É uma questão – creio – de civilidade e de respeito à dignidade das pessoas.”