LGPD: um benefício para a proteção dos dados pessoais dos brasileiros

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Paróquias e instituições religiosas estão no processo de estudo e adequação frente às novas exigências decorrentes da lei geral de proteção de dados
Publicado em: 11/02/2022 - 17:30
Créditos: Redação

Os avanços tecnológicos têm, constantemente, mudado a forma como as empresas e organizações produzem e armazenam as informações. O formato on-line ganha espaço, e o cuidado com os relatórios sobre o perfil dos cidadãos necessita de atenção, a fim de se evitar fraudes e o uso indevido das informações.

Para garantir a segurança desses dados, está em vigor desde setembro de 2020 a Lei 13.709/2018 – Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) –, que estabelece as diretrizes para a coleta, processamento e armazenamento de dados pessoais.

PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS E SENSÍVEIS

A LGPD aborda os dados em duas categorias: dados pessoais, com as informações que identificam alguém (CPF, RG e nome) – alguns incluem nesse rol também informações de caráter cadastral (endereço, telefone, informações bancárias); e os dados sensíveis (origem racial, étnica, convicção religiosa, opinião política ou filiações partidárias, opções referentes à saúde).

Em entrevista ao O SÃO PAULO, Crisleine Yamaji, advogada, doutora em Direito Civil, professora de Direito Privado e colaboradora de LGPD nas Paróquias Nossa Senhora do Brasil e São Vito Mártir, na Região Episcopal Sé, destacou que “esse tratamento de dados envolve uma série de ações e operações de conduta daqueles que os detêm, já que podem ser usados para o bem ou para o mal”.

EDIÇÃO DE NORMATIVOS INFRALEGAIS

Apesar de sancionada em 2018, a LGPD entrou em vigor aos poucos e vem sendo contemplada por uma paulatina edição de normativos infralegais. “Aos poucos, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) tem regulamentado aspectos importantes da Lei, ou seja, editado normas infralegais adicionais para complementar e detalhar melhor a sua atuação, alguns conceitos da LGPD, seus critérios de aplicação e interpretação”, destacou Crisleine.

“Esse é o caso da edição da Resolução nº 2, de 27 de janeiro de 2022, que trata da regulamentação dos agentes de tratamento de pequeno porte. O conceito inclui as pessoas jurídicas de direito privado, entre as quais as organizações religiosas que poderão ser beneficiadas por esse tratamento”, explicou.

LGPD E AS INSTITUIÇÕES RELIGIOSAS

A advogada ressaltou que, antes mesmo da edição dessa resolução, várias paróquias e entidades sem fins lucrativos católicas iniciaram a revisão de suas operações de tratamento de dados, a fim de se enquadrarem espontaneamente na lei e garantir a segurança dos dados pessoais não só de paroquianos, mas de colaboradores, voluntários, doadores, entre outros.

“As paróquias lidam com muitos dados pessoais e também com dados sensíveis, tanto de adultos quanto de crianças e idosos, e isso exige atenção redobrada”, disse, recordando que “muitas paróquias ainda coletam dados fisicamente, em cadastros feitos em fichas de papel, mas há todo um sistema eletrônico de cadastro, troca de e-mails, mensagens de WhatsApp ou redes sociais, formulários em sites que precisam de atenção.

Uma mudança provocada, enfatizou Crisleine, foi “a reflexão sobre a aplicação no dia a dia dos princípios da LGPD: a finalidade da coleta de dados, necessidade dos dados, adequação às finalidades, transparência das informações no uso dos dados, segurança e prevenção a incidentes e a responsabilização de todos”, evidenciou.

Outro aspecto é a definição da base legal do tratamento de dados. “O consentimento não é a única forma de tratamento e, também, não pode sempre ser considerado a forma mais adequada para todos os casos. Por exemplo, muito do que acontece na Igreja Católica é pautado por cumprimento de uma obrigação legal, especialmente no que diz respeito ao Direito Canônico, mas há também algumas situações em que se requer o consentimento específico ou o legítimo interesse ou o exercício regular de um direito na esfera judicial ou administrativa”, mencionou.

AÇÃO CONJUNTA

“A não adequação e o não atendimento de direitos de titulares de dados poderão levar a registros de reclamações direto na ANPD, a pedidos de esclarecimentos da própria ANPD, em sua atividade fiscalizadora de condutas, e à aplicação de sanções, o que inclui advertências, multas, publicização da infração e outras medidas”, ressaltou Crisleine.

Nesse processo de adaptação, devem participar ativamente os párocos, os membros da secretaria e os coordenadores de pastorais e todos aqueles que lidam com o tratamento de dados pessoais nas paróquias. “Por isso, a Igreja, e de modo particular a Arquidiocese de São Paulo, tem se preocupado com o treinamento e a capacitação das pessoas envolvidas no tratamento de dados pessoais”, detalhou a advogada.

Priscila de Castro Tieghi Almada, secretária da Paróquia Nossa Senhora do Brasil, enfatizou à reportagem que com a LGPD tem se intensificado o cuidado com os dados dos paroquianos: “As normas e indicativos da Lei vêm para assegurar ainda mais as informações coletadas na Paróquia”.

O QUE MUDA CONCRETAMENTE PARA AS PARÓQUIAS

Cada paróquia ou instituição religiosa deve ter um programa de privacidade para a proteção de dados, com cláusulas e regras claras. Segundo Crisleine Yamaji estes são os impactos mais significativos já percebidos em paróquias e pastorais:

Têm sido frequentes a adequação de sites de paróquias e a inclusão de uma clara política de privacidade com um canal de comunicação ativo para interação com os titulares de dados. As paróquias também começam a adequar o tratamento de dados dos seus empregados e prestadores de serviços;

Tem havido a inclusão de formas de descadastramento (opt-out) em mailings, newsletters e cadeias de e-mails. Muitas pessoas se cadastram por meio de sites das organizações para receber notícias. É importante que se tenha meios de descadastrar automaticamente, com link no próprio e-mail, ou terão que solicitar o descadastramento pelo canal de comunicação constante da política de privacidade, com uma resposta clara, tempestiva e efetiva das organizações;

Muitos formulários de catequeses, matrimônios, dizimistas, apostolados e outras pastorais têm passado por uma revisão criteriosa nas paróquias, com uma reflexão sobre a finalidade e necessidade da coleta dos dados; e a reflexão parte em torno do questionamento: todos os dados anteriormente coletados são realmente necessários para a finalidade daquele curso ou daquele sacramento? Isso leva a excluir campos e adequar formulários nas paróquias;

Outra revisão é da política de privacidade nos sites das organizações e da clareza das informações sobre a aplicação de outras políticas, quando, por exemplo, se usam meios de pagamento (links para pagamento por cartão de crédito ou boleto), redes sociais etc., ou da existência de uso de cookies ou google analytics nos sites;

As políticas de privacidade têm sido atualizadas também para deixar clara a própria posição das paróquias como controladoras conjuntas da Mitra Arquidiocesana e do necessário compartilhamento de informações com a Arquidiocese, em algumas situações;

Os mailings ou relação de cadastrados em newsletter passam por revisão para permitir um imediato descadastramento (opt-out) ou o cadastramento com escolha de direcionamento para uma determinada pastoral ou recebimento de uma determinada informação.