A dimensão social do Evangelho

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O anúncio da mensagem de Jesus e de sua Pessoa deve provocar a conversão naquele que a acolhe
Publicado em: 24/09/2014 - 10:30
Créditos: Edição nº 3020 do Jornal O SÃO PAULO – página 05

“Evangelizar é tornar o Reino de Deus presente no mundo”, diz o Papa Francisco na exortação apostólica “A Alegria do Evangelho” (n.176). De fato, o anúncio da mensagem de Jesus e de sua Pessoa deve provocar a conversão naquele que a acolhe, no seu modo de pensar, de ser e de viver, e ultrapassa o âmbito meramente individual e desemboca na organização da vida em todas as suas dimensões. Existe “uma conexão íntima entre evangelização e promoção humana”.

Assim, o Papa se coloca na grande esteira da Doutrina Social da Igreja, em seus “princípios permanentes” que balizam as “exigências da justiça através do uso responsável da liberdade, de atender aos direitos da liberdade através do cumprimento dos deveres da justiça” (ÁVILA, Pequena Enciclopédia de Doutrina Social da Igreja, p. 163). Sua história se inaugura com a encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII (1891), mas sua pré-história começa com a libertação do povo de Deus do jugo de seus opressores (cf. Êxodo), que continua com a voz dos profetas (cf. Amós). Mas foi, sobretudo com o surgimento da chamada questão social – consequência da revolução industrial dos séculos XVIII-XIX: abandono do campo, concentração urbana com grandes ondas migratórias, acumulação do capital e operariado, salário e emprego etc. (cf. Op. Cit., p. 379) -, que inúmeros pensadores católicos, antes mesmo da difusão do marxismo, analisaram com extraordinária clarividência os grandes problemas sociais de nosso tempo.

O Papa Francisco ressalta o que há de positivo no tempo em que vivemos: “os progressos que se verificam no âmbito da saúde, da educação e da comunicação. Todavia, não podemos esquecer-nos que a maior parte dos homens e mulheres do nosso tempo vive o seu dia a dia precariamente; crescem a falta de respeito e a violência, a desigualdade social torna-se cada vez mais patente. Essa mudança de época foi causada pelos enormes saltos qualitativos, quantitativos, velozes e acumulados que se verificam no progresso científico, nas inovações tecnológicas” (Evangelii Gaudium, 52).

Portanto, é dever dos cristãos dizer “Não a uma economia da exclusão, (nn. 53-54). Não à nova idolatria do dinheiro (nn. 55-56). Não a um dinheiro que governa em vez de servir (nn. 57-58). Não à desigualdade social que gera violência (nn. 59-60), e “aprender a descobrir Jesus no rosto dos outros, na sua voz, nas suas reivindicações, sem nos cansarmos jamais de optar pela fraternidade, que sabe ver a grandeza sagrada do próximo, que sabe descobrir Deus em cada ser humano”. Eis o que deve fundamentar a vida social a partir do Evangelho: “Confessar um Pai que ama infinitamente cada ser humano, confessar que o Filho de Deus assumiu a nossa carne humana, e que sua redenção tem um sentido social. Confessar que o Espírito Santo atua em todos implica reconhecer que Ele procura permear toda a situação humana e todos os vínculos sociais.”  A evangelização procura colaborar também com essa ação libertadora do Espírito.

A vida cristã tem seu modelo na Trindade, na qual a diversidade das Pessoas divinas não compromete a comunhão. Tal deve suceder entre nós, pessoas humanas, criados “à Sua imagem e semelhança”: promover o bem comum e garantir a realização pessoal de cada um, mediante o exercício do trabalho profissional e das diversas vocações e serviços, cujo fim é sempre a caridade, segundo a verdade, no bem e na justiça.

Padre Sancley Lopes Gondim