Novos cardeais para uma Igreja missionária

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04/07/2018 - 10:45

No dia 28 de junho passado, o Papa Francisco presidiu mais um Consistório público na basílica de São Pedro para a criação de 14 cardeais. Para acolher os novos membros do Colégio Cardinalício, estavam presentes a maioria dos cardeais do mundo inteiro. Do Brasil, éramos cinco. 

É interessante notar a proveniência dos novos cardeais: quatro colaboram diretamente com o Papa na Cúria Romana; três são da Ásia; um é da África; três são da América Latina; três trabalham em diversos países europeus. Três dos novos cardeais já superaram 80 anos de idade e 11 integram o Colégio de eleitores num eventual Conclave. 

Seguindo a prática já presente nos Consistórios mais recentes, Francisco confirmou o seu olhar para as “periferias” do mundo e da Igreja, chamando bispos de países com pouca presença católica para integrarem o Colégio Cardinalício, como o Patriarca do rito caldeu, do Iraque, o arcebispo de Karachi (Paquistão), o arcebispo de Osaka (Japão) e o de Toamasina (Madagascar). 

Essas mesmas nomeações também revelam a preocupação missionária de Francisco e sinalizam para uma “Igreja em saída missionária”, ao encontro dos povos e das culturas diversas. Por aí também se pode compreender como neste grupo de novos cardeais ainda não foram incluídos os arcebispos de sedes importantes, como Milão, Veneza, Turim e Paris. Delineia-se, assim, cada vez mais, o rosto universal da Igreja Católica também no Colégio Cardinalício. 

Na América Latina, com a nomeação cardinalícia do arcebispo do Huancayo (Peru) e do Prelado emérito de Corocoro (Bolívia), configura-se um rosto mais amazônico e indígena da Igreja.

O Evangelho da celebração do Consistório tratava da subida de Jesus a Jerusalém para enfrentar o drama de sua paixão, enquanto os discípulos, atrás dele, vão discutindo sobre qual deles é o mais importante e quem deveria ocupar os lugares de maior destaque ao lado do Mestre (cf. Mc 10,32-45). Na sua homilia, o Papa Francisco recordou que o chamado a ser cardeal não equivale a um prêmio por uma carreira bem sucedida, nem é uma promessa de honrarias e privilégios, mas é um chamado a servir mais e para assumir maiores responsabilidades na promoção da vida e da missão da Igreja, em comunhão com o Sucessor de Pedro. 

A cena do Evangelho fala da discussão entre os discípulos, movidos por ciúmes, vaidades e sede de poder e privilégios. “Pode acontecer também hoje nas nossas organizações eclesiais”, observou o Papa. Com as palavras de Jesus aos discípulos – “não será assim entre vós”, Francisco recordou que a Igreja não pode ser movida pela busca de poder e vanglória; ela não pode ser autorreferencial, nem deve ficar centrada em si mesma, mas voltar-se inteiramente para o Cristo e para o Evangelho em função do bem da humanidade e da glória de Deus.

Ao entregar o barrete vermelho a cada novo cardeal, o Papa lembrou o significado desse sinal da dignidade cardinalícia: o novo cardeal deve “estar disposto a comportar-se com fortaleza, até à efusão do sangue, em vista do crescimento da fé cristã, da paz e da tranquilidade do povo de Deus, da liberdade e a difusão da Santa Igreja Romana”. A entrega do anel cardinalício foi acompanhada por estas palavras: “recebe o anel da mão de Pedro e sabe que com o amor do Príncipe dos Apóstolos se fortalece o teu vínculo de amor para com a Igreja”.  Os cardeais são unidos estreitamente ao Sucessor de Pedro, com quem colaboram na sua solicitude por todas as Igrejas. 

Essa estreita comunhão com a missão universal do Papa não se restringe a uma eventual participação num Conclave para a eleição de um novo Papa. Ela se expressa na colaboração efetiva com o ministério petrino do Papa nos múltiplos serviços da Cúria Romana e na implementação das diretrizes universais emanadas pelo Papa. Francisco recordou ainda o que Jesus ensinou aos discípulos: o maior entre vós é aquele que serve mais. E quem quiser ser o primeiro, coloque-se a serviço de todos (cf. Mc 10,43-45).
 

Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo Metropolitano de São Paulo
Publicado em O SÃO PAULO, na edição de 04/07/2018