As três cruzes

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23/03/2016 - 12:00

Vemos três cruzes levantadas no Calvário. Cada uma tem um significado: a cruz da revolta e do desespero; a cruz do arrependimento; e a Cruz da inocência.

A primeira não deve ser a nossa, porque leva ao afastamento de Deus. A segunda deve ser a nossa, porque somos culpados pelos nossos pecados. E a terceira não merecemos, em razão das nossas culpas.

Assim, o modo como encaramos a cruz aproxima-nos ou nos afasta de Deus. Isso foi o que aconteceu com os dois ladrões crucificados junto de Jesus. O primeiro se revolta. Não quer aceitar. Blasfema contra Deus. Desafia o próprio Cristo: “Um dos malfeitores, ali crucificados, blasfemava contra ele: ‘Se és o Cristo, salva-te a ti mesmo e a nós!’” (Lc 23,39). Isso nos acontece quando relutamos em aceitar as consequências dos próprios erros. O ladrão condenado volta- se contra Cristo, como se Deus fosse culpado pelas suas decisões erradas.

O outro converte-se ao ver Jesus manso e misericordioso. “Nem sequer temes a Deus, tu que sofres o mesmo suplício? Para nós isto é justo: recebemos o que mereceram os nossos crimes, mas este não fez mal algum.” (Lc 23, 40-41) Essa deve ser a nossa atitude: reconhecer sinceramente as próprias debilidades. Aceitar as consequências pelo mau uso da liberdade. O ladrão arrependido converte- se no último instante da vida. Essa deve ser a nossa reação: em vez de acusar os outros ou de nos revoltarmos contra Deus, devemos reconhecer humildemente os nossos pecados, sem perder a esperança de sermos perdoados.

A terceira atitude diante da cruz é a de Jesus. O Papa Francisco fala-nos do amor de Jesus: “O que foi que a cruz deixou naqueles que a viram, naqueles que a tocaram? O que deixa em cada um de nós? Deixa um bem que ninguém mais pode nos dar: a certeza do amor inabalável de Deus por nós. Um amor tão grande que entra no nosso pecado e o perdoa, entra no nosso sofrimento e nos dá a força para poder levá-lo, entra também na morte para derrotá-la e nos salvar. Na Cruz de Cristo está todo o amor de Deus, a sua imensa misericórdia. E esse é um amor em que podemos confiar, em que podemos crer”. (Via-Sacra da JMJ no Rio de Janeiro, 26/07/2013).

Não sejamos indiferentes diante da Paixão de Cristo. Jesus se entregou por mim. Tudo o que sofreu durante a Paixão foi por causa dos meus pecados e os de todos os homens.

Contemplar a Cruz de Jesus deve provocar a dor em nossos corações. Essa é a maneira de aliviar o peso da Cruz de Cristo: decidir-nos a romper com os nossos pecados. Chegar ao arrependimento profundo e verdadeiro de quem decide: não quero mais sofrer e fazer sofrer com esses meus desatinos.

Fazer uma boa confissão pela Páscoa deste Ano Santo da Misericórdia. Morrer para o egoísmo, abominar o orgulho, romper com as inquietações provenientes da impureza, renunciar a esse clima de guerra e de competição com os outros etc.

A mansidão de Jesus nos levará a aceitar o próprio sofrimento como purificação. Mesmo que Deus permita o nosso sofrimento, mesmo que venham sobre nós as dores, não nos sentiremos nunca abandonados, porque estamos abraçando a nossa parcela da Cruz.

Queremos recomeçar uma vida nova, com a Ressurreição e a Páscoa. A certeza de que Cristo triunfou definitivamente sobre o pecado e a morte nos dará segurança.

Dom Carlos Lema
Bispo auxiliar da Arquidiocese;
e vigário episcopal para a educação e universidade

Artigo publicado no Jornal O SÃO PAULO - edição 3094 -23 a 29 de março