A reforma deve prosseguir

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25/11/2015 - 09:45

No Angelus o Pontífice afirmou que roubar documentos é um crime e um gesto que não ajuda
Com a ajuda dos meus colaboradores e o apoio de toda a Igreja

“A propósito de documentos reservados da Santa Sé que foram subtraídos e publicados... gostaria de vos dizer antes de tudo que roubar aqueles documentos é um crime. É um gesto deplorável que não ajuda”. Com estas considerações no final do Angelus de domingo 8 de Novembro na praça de São Pedro, o Papa Francisco garantiu aos fiéis “que este triste acontecimento” não o “distrai do trabalho de reforma” que “leva em frente” com os seus “colaboradores e com a ajuda de todos”. Precedentemente, o Pontífice dedicou a sua reflexão ao trecho evangélico do dia, sublinhando que o episódio do óbolo da viúva é composto “por duas partes: uma, na qual se descreve como não devem ser os seguidores de Cristo; a outra, na qual se propõe um ideal exemplar de cristão”. Eis a meditação do Santo Padre.

Amados irmãos e irmãs, bom dia com este bonito sol!

O trecho do Evangelho deste domingo é composto por duas partes: uma, na qual se descreve como não devem ser os seguidores de Cristo; a outra, na qual se propõe um ideal exemplar de cristão.

Comecemos da primeira: o que não devemos fazer. Na primeira parte, Jesus atribui aos escribas, mestres da lei, três defeitos que se manifestam no seu estilo de vida: soberba, avidez e hipocrisia. Eles - diz Jesus - gostam “de ser cumprimentados nas praças públicas, e de se sentar nas primeiras cadeiras nas sinagogas e de ocupar os primeiros lugares nos banquetes” (Mc 12, 38-39). Mas por detrás de aparências tão solenes escondem-se falsidades e injustiças. Enquanto se ostentam em público, usam a sua autoridade para “devorar os bens das viúvas” (cf. v. 40) que, juntamente com os órfãos e os estrangeiros, eram consideradas as pessoas mais indefesas e menos tuteladas. Além disso, os escribas “rezam prolongadamente para se mostrar” (v. 40). Ainda hoje existe o risco de assumir estas atitudes. Por exemplo, quando se separa a oração da justiça, porque não se pode prestar culto a Deus e prejudicar os pobres. Ou então quando dizemos que amamos a Deus mas, ao contrário, antepomos a Ele a nossa vanglória, a nossa vantagem.

É nesta linha que se insere a segunda parte do Evangelho de hoje. A cena é ambientada no templo de Jerusalém, precisamente no lugar onde as pessoas lançavam as moedas como oferta. Há tantos ricos que oferecem muitas moedas, e há uma mulher pobre, viúva, que só oferece dois tostões, duas pequenas moedas. Jesus observa atentamente aquela mulher e chama a atenção dos discípulos para o contraste evidente da cena. Os ricos deram com grande ostentação aquilo que para eles era supérfluo, enquanto a viúva, com discrição e humildade, ofereceu “tudo o que tinha para o seu sustento” (v. 44); por isso - diz Jesus - ela deu mais do que todos. Por causa da sua pobreza extrema, poderia ter oferecido uma única moeda para o templo e conservado a outra para si. Mas ela não quer dividir a meio com Deus: priva-se de tudo. Na sua pobreza ela entendeu que, se tiver Deus, tem tudo; sente-se amada totalmente por Ele e, por sua vez, ama-o também de modo total. Que bonito exemplo, aquela velhinha!

Hoje Jesus diz-nos, também a nós, que a medida de juízo não é a quantidade, mas a plenitude. Existe uma diferença entre quantidade e plenitude. Podes ter muito dinheiro, mas ser vazio: não há plenitude no teu coração. Durante esta semana, meditai sobre a diferença que existe entre quantidade e plenitude. Não é questão de porta-moedas, mas de coração. Há diferença entre porta-moedas e coração... Existem doenças cardíacas que levam o coração a descer até ao porta-moedas... E isto não é bom! Amar a Deus “com todo o coração” significa confiar nele, na sua Providência, e servi-lo nos irmãos mais pobres sem esperar nada em troca.

Permiti que vos conte uma anedota, que aconteceu na minha diocese precedente. Uma mãe estava à mesa com os seus três filhos; o pai estava no trabalho; e comiam bifes à milanesa... Naquele momento batem à porta e um dos filhos - pequenino, de 5 ou 6 anos, o maior de 7 anos - vai ver quem é, volta e diz: “Mãe, há um mendigo que pede para comer”. E a mãe, uma boa cristã, pergunta-lhes: “Que fazemos?” - “Demos-lhe algo, mãe...” - “Muito bem”. Pega no garfo e na faca e corta metade de cada um dos bifes. “Ah, não, mãe, não! Assim não! Tira-o do frigorífico” - “Não, façamos três sanduíches assim!”. E os filhos aprenderam que a verdadeira caridade se oferece, não com aquilo que nos sobra, mas com o que nos é necessário. Estou convicto de que naquela tarde eles sentiram um pouco de fome... Mas é assim que se faz!

Diante das necessidades do próximo, somos chamados a privar-nos - como aquelas crianças, de metade do bife - de algo que nos é indispensável, não apenas do supérfluo; somos chamados a dar o tempo necessário, não só aquele que nos sobeja; somos chamados a oferecer um nosso talento imediatamente e de modo incondicional, e não depois de o ter utilizado para as nossas finalidades pessoais ou de grupo.

Peçamos ao Senhor que nos admita na escola desta pobre viúva que Jesus, diante da perplexidade dos discípulos, faz subir à cátedra e apresenta como mestra do Evangelho vivo. Mediante a intercessão de Maria, a pobre mulher que ofereceu a sua vida inteira a Deus por nós, peçamos o dom de um coração pobre, mas rico de uma generosidade jubilosa e gratuita.

Após a oração mariana, o Pontífice recordou o furto de documentos reservados e em seguida recordou o dia de ação de graças celebrado pela Igreja na Itália.

Sei que muitos de vós ficaram perturbados com as notícias que circularam nos últimos dias, a propósito de documentos reservados da Santa Sé, que foram subtraídos e publicados.

Por isso, gostaria de vos dizer antes de tudo que roubar aqueles documentos é um crime. É um gesto deplorável que não ajuda. Eu mesmo pedi que se fizesse este estudo, e tanto eu como os meus colaboradores já os conhecíamos bem; e foram tomadas algumas medidas que começaram a dar os seus frutos, alguns dos quais já visíveis.

Portanto, quero assegurar-vos que este triste acontecimento não me distrai do trabalho de reforma que levo em frente com os meus colaboradores e com a ajuda de todos vós. Sim, com o apoio da Igreja inteira, porque a Igreja se renova com a oração e com a santidade quotidiana de cada batizado.

Por conseguinte, agradeço-vos e peço-vos que continueis a rezar pelo Papa e pela Igreja, sem vos deixar perturbar mas indo em frente com confiança e esperança.

Fonte: Edição nº 46 do Jornal L’OSSERVATORE ROMANO – página 03