Igreja precisa adaptar linguagem à cultura atual

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<p>Dom Celli fala sobre os desafios da Igreja de ser presença no “ambiente digital”.</p>
Publicado em: 05/02/2015 - 11:15
Créditos: Edição nº 3037 do Jornal O SÃO PAULO – página 11

Presidente do Pontifício Conselho para as Comunicações Sociais, da Cúria Romana, Dom Cláudio Maria Celli falou a O SÃO PAULO durante sua estada no Rio de Janeiro (RJ) graças a colaboração da assessoria de imprensa da Arquidiocese de São Sebastião, com o jornalista Paulo Ubaldino. Nessa entrevista, Dom Celli fala sobre os desafios da Igreja de ser presença no “ambiente digital”.


O SÃO PAULO – Quais são os desafios da Igreja no campo da comunicação atualmente?

Dom Cláudio Maria Celli – As novas tecnologias tem originado um verdadeiro ambiente de vida. Hoje em dia se fala até de um “continente digital”. O primeiro desafio é o de anunciar o Evangelho nesse “continente digital”. Nele habitam homens e mulheres que, provavelmente, nunca irão a uma igreja, mas a Igreja sente um dever profundo ligado à missão que foi entregue por Jesus, aquela de anunciar Jesus Cristo a todo mundo, e não só àqueles que vão à igreja, mas também àqueles que não conhecem Jesus Cristo.

O segundo desafio é que devemos anunciar Jesus com uma linguagem que o homem e a mulher de hoje entendam. Uma coisa é falar para um menino, outra coisa é falar para um homem e outra para uma pessoa mais velha. O Evangelho é sempre o mesmo, mas tenho que anunciar Jesus em uma linguagem que as pessoas que me escutam possam me entender. Além disso, a Igreja é a mãe e, em sua comunicação, deve manifestar essa dimensão de mãe, o que significa proximidade, significa caminhar com o homem e a mulher de hoje nos caminhos da vida, significa abrir as portas e o coração aos homens e mulheres de hoje que sofrem, que estão tristes e que, muitas vezes, não tenham descoberto o sentido de suas vidas, o sabor de suas vidas.

Como o Senhor avalia a presença da igreja no chamado ambiente digital?

A igreja se move com ritmos distintos. Há setores da Igreja que se movem com mais velocidade e há setores da Igreja que se movem mais lentamente. Eu creio que a Igreja, de modo geral, tem condições de sintonizar e de entrar em harmonia com o continente digital e com os homens e mulheres que nele habitam. Eu conheço pouco o Brasil, mas na Europa, por exemplo, um menino de 10 anos passa de três a cinco horas por dia na frente do computador. Isso significa que sua mentalidade, sua maneira de ser, sua cultura está mudando. Ele sabe perfeitamente o que é estar conectado. A internet está mudando nossa maneira de ser presente no mundo.

Os pais deveriam educar seus filhos para a internet?

Como os pais educam seus filhos para estarem presentes no mundo digital é um tema importante porque o mundo digital tem grandes e positivas oportunidades, mas também tem grandes perigos.

De modo geral, os jovens conhecem mais as ferramentas da tecnologia do que seus pais. Ai há um fenômeno muito interessante e simpático: Há pessoas mais velhas que são avós e que compram um computador e aprendem a navegar porque querem falar com os seus netos. Eu conheço avôs e avós que aprenderam a mexer no computador, pois seus netos estão longe, mas eles querem falar com os netos, assim que entram no Skype. E você encontra pessoas mais velhas que passam horas conversando com seus netos, isso é muito bonito.

Como fazer pastoral no ambiente digital?

Papa Bento, antes do Papa Francisco, nos disse: “não tenham medo de entrar nas redes sociais, mas deem testemunhos de Jesus nelas”. Isso significa que minha presença não é apenas uma presença, mas que nessa presença eu possa dar testemunho dos valores do Evangelho.

As relações interpessoais podem ser prejudicadas pelo uso excessivo da internet. Como a Igreja vê essa questão?

O risco que se corre é que eu posso ter mil amigos virtuais na internet e não ter amigos na vida. Eu passo muito tempo da vida na frente do computador, jogando com meus amigos virtuais. Um amigo meu logo contou para os senhores Bispos, que encontrou seu filho de 10 anos que estava jogando no computador com outro garoto, um japonês. Agora um menino estava na Espanha e o outro no Japão e os dois jogavam no computador, isso é um encontro muito positivo, porque abre as portas para a vida. Eu não estou somente ligado ao meu ambiente, não sou apenas um cidadão desta nação, desse país, eu passo a ser um cidadão do mundo. Mas há um risco de eu ser absorvido por esse mundo da internet e não ter relações com meus amigos, com aqueles que vão à escola, à paróquia.

O que mudou nas orientações dentro do pontifício conselho com o Papa Francisco?

O Papa Francisco é um Papa comunicador, ele comunica com sua palavra, com sua pessoa,com seus gestos e com sua maneira de ser. Eu tenho muitos contatos com o Papa Francisco pelo meu trabalho, e ele nos disse para ir adiante, para seguir em frente.

Para Francisco, em sua primeira mensagem para a Jornada Mundial das Comunicações disse: não tenham medo de entrar nas redes sociais, não apenas porque está na moda, mas também é um ambiente onde tenho que anunciar certos valores, como por exemplo, o valor da família em meio a uma cultura que, cada vez mais, as relações humanas são descartáveis.

Rafael Alberto

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