Sorrateiramente... - Raul de Amorim

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31/03/2017 - 00:15

Jo.7,1-2.10.25-30

Ao longo dos capítulos 1 a 12 do Evangelho de João, vai acontecendo a progressiva revelação que Jesus faz de si mesmo aos discípulos e ao povo. Ao mesmo tempo, e na mesma proporção, vai crescendo o fechamento e a oposição das autoridades contra Jesus. A leitura é um pouco picotada (versículos), mas muito importante para nossa reflexão.

Jo. 7,1-2: Depois disso, Jesus saiu andando pela Galiléia. Ele não queria andar pela Judéia porque os judeus queriam matá-lo. Mas estava próxima a festa judaica das Tendas.

A festa das Tendas ou Tabernáculos ou ainda das Cabanas era realizada durante sete dias. O objetivo dessa festa era agradecer a Deus pela colheita passada e suplicar para o ano novo a água necessária para os campos, a fecundidade da terra e o bem estar.

O povo montava as barracas (tendas) e assim recordavam o tempo em que, após a libertação do Egito, viveram 40 anos como peregrinos no deserto. No livro do Levítico (Lv. 23,33-36.39-43) encontramos a recomendação de Deus a Moisés para se fazer essa celebração. Era a festa mais popular e alegre do povo judeu.

Observação importante: Tanto aqui no capítulo 7 como nos outros capítulos, o evangelista João fala de “judeus”, e de “vocês judeus”, como se ele e Jesus não fossem judeus. Este jeito de falar revela a situação da trágica ruptura que ocorreu no fim do primeiro século entre os judeus (Sinagoga) e os cristãos (Igreja). Hoje não podemos alimentar essa polêmica. Nunca podemos esquecer que Jesus é judeu. Nasceu judeu, viveu como judeu e morreu como judeu. Continuemos nossa reflexão do evangelho.

Jo. 7,10: Mas depois que seus irmãos subiram para a festa, então ele também subiu; não publicamente, mas às escondidas.

Jesus decide ir à festa das Tendas. A geografia da vida de Jesus no evangelho de João é diferente nos outros evangelhos. É mais completa. Conforme os outros evangelhos, Jesus foi apenas uma única vez a Jerusalém, aquela em que foi preso e morto.

Conforme o evangelho de João, Jesus foi no mínimo duas ou três vezes a Jerusalém para a festa da Páscoa. Por isso sabemos que a vida pública de Jesus durou em torno de três anos. Jesus encontra um jeito de participar da festa, de forma sorrateira, às escondidas. A missão tem que continuar...

Jo. 7,25-27: Algumas pessoas de Jerusalém diziam: “Não é esse que estão procurando para matar? Ele está aí falando abertamente e ninguém lhe diz nada. Será que as autoridades se convenceram de que ele é o Cristo?

O povo está confuso. Sabe que querem matar Jesus, mas ele fala publicamente às pessoas que querem ouvi-lo. Como entender isso? Será que as autoridades tinham se convencido que ele era o Messias? Mas como é que Jesus pode ser o Messias?  Todos sabem que ele vem de Nazaré. Naquele tempo se ensinava: “quando o Cristo vier ninguém saberá de onde ele vem.”

Os ensinamentos e as tradições religiosas oferecem segurança ao povo e às autoridades, mas não levam ao reconhecimento do Messias.

Jo. 7,28-29: Jesus então falou bem alto, enquanto estava ensinando no Templo: “Será que vocês me conhecem e sabem mesmo de onde eu sou? Eu não vim por mim mesmo. Quem me enviou é verdadeiro, e vocês não o conhecem. Eu o conheço porque venho de junto dele, e foi ele quem me enviou”.

Jesus grita e fala da sua origem. O ser humano não pode por sua vontade penetrar a verdadeira personalidade de Jesus, se ele não a revelar; e Ele não a pode revelar sem revelar ao mesmo tempo o Pai que o enviou. Eles não conhecem o Pai porque não aceitam a revelação de Jesus. Ele não veio por vontade própria, mas como todo profeta veio obedecendo a uma vocação, que é o segredo da vida dele.

Jo. 7,30: Então trataram de prender Jesus. Mas ninguém lançou sobre ele as mãos, porque a hora dele ainda não tinha chegado.

No evangelho de João quem determina a hora e o rumo dos acontecimentos não são os que detêm o poder, mas o próprio Jesus. Mesmo pendurado na cruz, é Jesus quem determina até a hora de morrer. (Jo. 19,29-30)