A convocação da Assembleia do Sínodo dos Bispos para a região da Pan-Amazônia, que acontecerá em outubro de 2019, em Roma, é fruto de uma antiga preocupação da Igreja Católica com essa vasta região que abrange nove países da América do Sul. No próprio anúncio feito durante a oração do Ângelus, no dia 15, o Papa Francisco afirmou que o Sínodo foi convocado “atendendo o desejo de algumas conferências episcopais da América Latina, assim como ouvindo a voz de muitos pastores e fiéis de várias partes do mundo”.
Com um território de aproximadamente 6,9 milhões de quilômetros quadrados, a Pan-Amazônia compreende o Brasil (67%), Peru (13%), Bolívia (11%), Colômbia (6%), Equador (2%), Venezuela (1%), além de Suriname, Guiana e Guiana Francesa, que somam 0,15% do restante do território. Na região habitam mais de 30 milhões de pessoas, sendo 2.779.478 indígenas pertencentes a 390 povos autóctones e 137 povos “isolados” (não contatados). São pessoas que falam 240 línguas diferentes, pertencentes a 49 ramos linguísticos.
A ação evangelizadora da Igreja na Amazônia começou há 400 anos com a colonização europeia na região. Atualmente, a Igreja se organiza na região em 56 circunscrições eclesiásticas, entre arquidioceses, dioceses e prelazias.
Repam
Em 2014, foi criada, em Brasília (DF), a Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam), organismo ligado ao Conselho Episcopal Latino-Americano (Celam), que reúne os países que compõem a Amazônia. A Repam, que tem como Presidente o Cardeal Cláudio Hummes, Arcebispo Emérito de São Paulo, nasceu como uma oportunidade de apoio, solidariedade e fortalecimento da ação evangelizadora no contexto amazônico.
Em entrevista ao O SÃO PAULO , na edição 3115, Dom Cláudio explicou que entende que o Papa Francisco deseja uma Igreja que, em sua evangelização, se envolva realmente com a cultura, a história, os problemas, os sonhos e os projetos do povo amazônico, incluindo, de modo, particular o universo dos povos indígenas, que são originários da região.
Desafios
Dentre os desafios da evangelização na Amazônia, o Cardeal destacou o número insuficiente de missionários, que chegam a percorrer enormes distâncias para visitar povoados, o que faz que comunidades de indígenas e de ribeirinhos raramente recebam os sacramentos da Eucaristia, Reconciliação e Unção dos Enfermos. “Como pode uma comunidade católica florescer se faltam quase totalmente esses três sacramentos fundamentais do cotidiano dos católicos, somado à ausência física quase constante dos seus pastores?”, indagou.
Ainda segundo Dom Cláudio, muitas comunidades indígenas que foram contatadas por missionários no passado e aderiram à fé católica, hoje estão migrando para seitas protestantes neopentecostais, devido à intensa atividade desses grupos e por falta de presença maior dos sacerdotes católicos. Dom Cláudio informou que há poucas dioceses na Amazônia que possuem um significativo número de clero autóctone. “Se considerarmos a evangelização específica dos índios, padres indígenas infelizmente quase não há”, ressaltou.
Os desafios da evangelização na Amazônia não se limitam aos povos da floresta. O fluxo migratório para os centros urbanos causa um crescimento desordenado das cidades, gerando bolsões de pobreza. Paralelo a isso, existem as questões ambientais, como desmatamento e o impacto socioambiental gerado pela construção de novas usinas hidrelétricas. Essa questão foi abordada pelo Papa Francisco na Encíclica Laudato Si’ (2015). “Cada vez mais nos damos conta de que a floresta em pé pode trazer muito mais riquezas a um país do que uma floresta derrubada. O desafio é como fazer a floresta produzir sem que precisemos derrubá-la. Os povos da Amazônia têm direito ao progresso e desenvolvimento, mas é preciso respeitar que eles é que devem decidir que tipo de desenvolvimento querem”, afirmou Dom Cláudio, ao apresentar o trabalho da Repam ao episcopado brasileiro durante a 55ª Assembleia Geral da CNBB, em abril.
Teste decisivo para a Igreja
O desejo de um sínodo para a Pan-Amazônia já havia sido manifestado há alguns meses pelo Papa em encontros com bispos sul-americanos. Em maio, ao receber o episcopado peruano, Francisco tratou do desafio da evangelização em comunidades remotas. Em setembro, durante a visita dos bispos da Conferência Episcopal do Equador, o Papa manifestou a intenção de realizar um sínodo para a Igreja na Pan-Amazônia. Em entrevista à rádio Vaticano , Dom René Coba Galarza, Secretário-Geral da conferência equatoriana, relatou que o Pontífice insistiu principalmente quanto ao respeito pela identidade desses povos e a proximidade que a Igreja deve lhes oferecer.
Desde o início de seu pontificado, o Papa Francisco chamou a atenção para a evangelização na Amazônia, seguindo seus predecessores, Bento XVI, São João Paulo II e o Beato Paulo VI, que, em 1972, afirmou que “Cristo aponta para a Amazônia”.
Em seu discurso aos bispos brasileiros durante a Jornada Mundial da Juventude de 2013, no Rio de Janeiro, o Papa Francisco definiu a Amazônia como “teste decisivo, banco de prova para a Igreja e a sociedade”. Ele recordou a presença dos missionários, congregações religiosas, sacerdotes, leigos e bispos. “A Igreja está na Amazônia, não como aqueles que têm as malas na mão para partir depois de terem explorado tudo o que puderam”, disse.
Na ocasião, o Santo Padre acrescentou a necessidade de ser “mais incentivada e relançada a obra da Igreja” na Amazônia. “Fazem falta formadores qualificados, especialmente formadores e professores de Teologia, para consolidar os resultados alcançados no campo da formação de um clero autóctone, inclusive para se ter sacerdotes adaptados às condições locais e consolidar, por assim dizer, o ‘rosto amazônico’ da Igreja”.
(Com informações de CNBB, Repam, Rádio Vaticano e IHU)