Papa às famílias: 'Obrigado por nos deixar sentar em suas mesas'

A A
Francisco participou do encontro com as famílias mexicanas no estádio Tuxtla Gutiérrez, em Chiapas na tarde desta segunda-feira
Publicado em: 16/02/2016 - 10:00
Créditos: Redação com Rádio Vaticano

“Prefiro uma família que procura uma vez e outra recomeçar a uma sociedade narcisista e obcecada com o luxo e o conforto. Prefiro uma família com o rosto cansado pelos sacrifícios aos rostos embelezados que nada entendem de ternura e compaixão”, afirmou o Papa Francisco durante o encontro com as famílias mexicanas no estádio Tuxtla Gutiérrez, em Chiapas na tarde desta segunda-feira, 15, quarto dia de sua 12ª viagem apostólica internacional.

O santo Padre foi acolhido por mais de mais de 50 mil pessoas e ouviu o testemunho de quatro famílias de realidades diversas.

O primeiro testemunho foi o de Manuel, 14 anos, vítima de distrofia muscular. Ele agradeceu ao Papa por ser amigo dos jovens e por levar a sua mensagem ao povo do Chiapas e lhe pediu para rezar por todos os adolescentes que vivem desanimados e atravessam momentos difíceis.

Em seguida, um casal deu um depoimento sobre a sua vida de seus pais, que têm 50 anos de casados. Falaram da aliança matrimonial, do amor fiel e de sua participação nos sacramentos.

A terceira família era formada por um casal de divorciados e recasados civilmente, que não têm acesso à comunhão, mas participam da comunidade e têm a percepção de recebê-la, segundo revelaram, através do serviço a seus irmãos mais carentes, doentes ou encarcerados.

O último testemunho foi o de Beatriz, enfermeira e mãe solteira, de origem simples, que renunciou ao aborto várias vezes e criou seus filhos sozinha. Ela pediu a Deus que, assim como ela foi amada e acolhida pela Igreja, outras mulheres tenham esta mesma bênção.

Sentar-se à mesa

O Papa iniciou seu discurso agradecendo estas famílias, que “nos permitiram sentar à sua ‘mesa’ onde partilham o pão que as alimenta e o suor perante as dificuldades diárias: o pão das alegrias, da esperança, dos sonhos, e o suor perante as amarguras, as decepções e as quedas: Obrigado por nos ter permitido sentar à sua mesa e conhecer o seu lar”.

Partindo das palavras de Manuel, que se “encheu de vontade” para a vida, Francisco refletiu que “é isto o que Deus sempre sonhou: quando chegou a plenitude dos tempos, Deus Pai encheu de vontade a humanidade para sempre, dando-nos o seu Filho”. O Papa emocionou todos ao citar o exemplo dos pais de Manuel, que ouviram ajoelhados o testemunho do menino.

E sempre com mais vigor, Francisco disse, quase gritando, que “Deus Pai encheu de vontade a nossa vida, porque o seu nome é amor, é dom gratuito, é dedicação, é misericórdia. Ele nos mostrou isso tudo, em toda a sua força e clareza, no seu Filho Jesus, que gastou a sua vida até à morte para tornar possível o Reino de Deus; um Reino que tem sabor de família, que tem sabor de vida partilhada”. 

Precariedade e isolamento, maus conselheiros

Lembrando o testemunho de Beatriz, Francisco afirmou que “a precariedade ameaça não só o estômago (o que é já muito!), mas pode ameaçar também a alma, pode insinuar-se em nós sem nos darmos conta: é a precariedade que nasce da solidão e do isolamento; e o isolamento é sempre um mau conselheiro”.

A receita para combater esta situação, que nos torna vulneráveis a muitas soluções aparentes, pode ser concretizada, por exemplo, por meio de leis que protejam e garantam o mínimo necessário para que as famílias e cada pessoa cresçam através do estudo e de um trabalho digno. Outro caminho é o compromisso pessoal, como sublinharam os testemunhos de Humberto e Cláudia: transmitindo o amor de Deus no serviço e na assistência aos outros. “Leis e engajamento pessoal são um binômio muito útil para romper a espiral de precariedade”, frisou o Pontífice.

Abordando as dificuldades que fragilizam as famílias hoje e que tornam suas vidas por vezes árduas e dolorosas, o Papa disse preferir uma família ferida que cada dia procura harmonizar o amor, a uma sociedade doente pelo confinamento e a comodidade do medo de amar. E criticou a "colonização ideológica que apresenta a família como um 'modelo superado'".

Terminando seu discurso, Francisco pediu a todos que rezassem com ele a Ave Maria e levou flores a uma imagem da Sagrada Família.

Outro momento tocante foi quando o Papa interrompeu o andamento do encontro quando ergueram à beira do palco um menino com deficiências, cadeirante, até o ponto em que o Pontífice pudesse tocar e beijar. Em vários momentos do evento, o Francisco trocou o seu carinho com as crianças presentes.

Na sequência, cerca de 200 casais com mais de 50 anos de matrimônio renovaram suas promessas matrimoniais diante do Papa e cantaram o hino “Amar é entregar-se”. Em seguida, o Papa se dirigiu ao aeroporto da cidade, de onde voou até Cidade do México, para passar a noite na Nunciatura Apostólica.