‘Não poderemos superar nossas pobrezas se não voltarmos o coração para Deus’

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No Dia Mundial dos Pobres, o Cardeal Odilo Scherer presidiu missa em casa de acolhida de pessoas em situação de rua, mantida pela missão Belém
Publicado em: 23/11/2018 - 15:45
Créditos: Redação

No domingo, 18, data em que a Igreja comemorou o 2º Dia Mundial dos Pobres, o Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo de São Paulo, presidiu missa na Casa Guadalupe, no Belezinho, uma das casas da Missão Belém para a acolhida de pessoas em situação de rua. 

Participaram da celebração cerca de cem pessoas, que haviam sido acolhidas pela comunidade naquele mesmo dia, além de mais 150 voluntários, a maioria deles ex-moradores de rua que hoje colaboram nas casas de acolhida. Também participou da Eucaristia o Cônsul Geral da Itália em São Paulo, Filippo La Rosa, em visita à casa, acompanhado da esposa e filhas.

A missa foi concelebrada pelo Padre Gianpietro Carraro, Fundador da Missão Belém, e pelos Padres Gilson Frank dos Reis e Paulo Gomes da Silva, membros da comunidade.

 

OUVIR O CLAMOR

Com o tema “Este pobre clama e o Senhor o escuta”, o Dia Mundial dos Pobres foi convocado pelo Papa Francisco ao término do Ano Santo Extraordinário da Misericórdia, em 2016, com o objetivo de chamar a atenção da Igreja e da sociedade para olhar com mais solicitude para os pobres de todo o mundo.

“São tantos os pobres. A grande pobreza está espalhada por toda a cidade, nas ruas, no centro, nos cortiços, nas moradias improvisadas, na grande periferia, nas comunidades e habitações muito pobres, onde falta muita coisa para haver uma vida digna”, afirmou o Cardeal, durante a homilia, lembrando, ainda, que a pobreza não atinge pessoas em particular, mas alcança até povos inteiros. “Hoje mesmo, o Papa Francisco recordou que precisamos estar atentos ao ‘grito dos pobres’”, acrescentou. 

O Arcebispo destacou também que, além da ajuda individual que é devida aos pobres, é necessário que se estabeleçam melhores condições de convivência e de justiça social para “superação da pobreza da qual muitos não conseguem sair devido a situações estruturais das políticas econômicas mundiais”, e que, “por isso, é necessário que também levantemos a voz e digamos ‘olhemos para os pobres’, para que eles possam sair da situação em que se encontram”, afirmou. 

Dirigindo-se às pessoas acolhidas, o Cardeal Scherer motivou-as a permanecer firmes, a fim de superar as situações de sofrimento e restaurar a vida. “A Missão Belém está propondo a vocês um caminho de restauração da vida, da dignidade”. 

“Não poderemos superar nossas pobrezas se não voltarmos o coração para Deus... A grande riqueza que Deus tem para nos dar não é deste mundo, é a vida eterna, a participação na sua vida”, acrescentou o Arcebispo que, recordando São João Paulo II, destacou: “Se nós damos muitas coisas aos pobres, mas ainda não lhes damos Deus, nem os ajudamos a encontrá-Lo, ainda demos muito pouco a eles”. 

 

UMA NOVA FAMÍLIA

A Casa Guadalupe é uma das quatro casas da Missão Belém na cidade, onde é feita a primeira acolhida das pessoas em situação de rua. “Os irmãos chegam aqui, vindos da rua, muitos deles da região da Cracolândia, no centro da Capital. Lá, os acolhidos ficam de três a seis dias até serem encaminhados a um dos sítios da comunidade no interior. Por semana, passam por essas casas 150 pessoas em média”, explicou o Padre Gianpietro. 

O caminho de acolhida e restauração feito nas casas da Missão Belém afeta não apenas a vida da pessoa que é acolhida, como também a de sua família. Nas casas da comunidade, é possível recuperar a dignidade e até construir uma nova família, como foi o caso de Leônidas Alves Junior, 44, e Adimeia Gomes Alves, 45, que deram o testemunho de sua história ao fim da missa. 

Leônidas chegou à Missão Belém em 2009. Ele conheceu as drogas aos 15 anos, quando morava com os pais em Campinas (SP). Expulso de casa pelo pai, foi para Santos, no litoral paulista. Lá, sua dependência química se agravou. Anos depois, em São Paulo, conheceu o crack e foi parar nas ruas. Após cinco dias internado por causa da droga, foi encaminhado à Missão Belém. “Eu fui acolhido com um abraço, me ofereceram banho, roupa limpa, alimento e uma cama para dormir. Ali, Deus estava me dando a oportunidade de recomeçar a minha vida, de ter uma vida nova”.

Nesse período, Leônidas recebeu a preparação para os sacramentos da Iniciação Cristã, sendo batizado, crismado, além de receber a primeira Comunhão. Foi quando ele conheceu Adimeia, que se envolvera com o crack havia 10 anos, e chegou a perder a guarda de suas quatro filhas, na época. Quando estava grávida da quinta filha, foi parar nas ruas, tendo sido acolhida pela Missão Belém em uma casa destinada a mães e gestantes. “Lá eu conheci o Leônidas, iniciamos um caminho de namoro e nos casamos. Da nossa união, nasceram dois filhos, Lucas e Maria”, contou Adimeia, que hoje cuida da Casa das Mães, onde foi acolhida.

Esses dois filhos se somaram às cinco meninas que Adimeia já tinha. No entanto, essa história não parou por aí: o casal também acolheu outras sete crianças abandonadas, formando, assim, uma grande família. “Aqui eu consegui, aos poucos, reconstruir aquilo que a droga havia destruído. Sempre desejei ter uma família e hoje Deus me concedeu uma família e a oportunidade de sermos família para essas crianças”, afirmou Leônidas. 

 

MULTIPLICADORES DA CARIDADE

Atualmente, a Missão Belém tem 180 casas-famílias, onde vivem cerca de 15 pessoas em cada uma delas, que são acompanhadas por um ex-morador de rua que se torna o “pai” ou “mãe” do grupo. Há, ainda, 45 casas que acolhem cerca de 600 enfermos que foram tirados das ruas.

“Gostaria de agradecer, em nome dos pobres, a todas as organizações da Igreja e da sociedade que se voltam para os pobres. Essas organizações precisam de apoio para que, por meio delas, também possamos ajudar. Elas são multiplicadoras da prática da caridade. Que todos possam se unir, de uma forma ou de outra, a essas organizações que fazem tanto pelos pobres em nome da Igreja, da fé, de Jesus Cristo”, manifestou o Cardeal. 

Dom Odilo também transmitiu palavras e gratidão às muitas pessoas que passaram pelo caminho de restauração na Missão Belém e hoje estão ajudando a restaurar outros irmãos. “Que bonito! Quem recebeu, agora, passa a ajudar. Assim nós podemos superar muitas situações de sofrimento e de pobreza”, afirmou. 

Por fim, o Cardeal reforçou às pessoas que apoiem o trabalho realizado pelas organizações que atuam com os pobres. “São agregadoras de caridade, de solidariedade. Assim, muitos podem ajudar a fazer o trabalho bonito de voluntariado em todos os níveis. Há muito espaço para muitas pessoas trabalharem”, concluiu.