Fake news e jornalismo de paz

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A partir da mensagem do Papa Francisco para o 52º Dia Mundial Das Comunicações Sociais, a Arquidiocese de São Paulo, em parceria com as Irmãs Paulinas, promoveu o evento ‘Caiu na Rede’.
Publicado em: 04/05/2018 - 11:15
Créditos: Redação

Fotos: Luciney Martins/O SÃO PAULO

No mundo atual, o jornalista não desempenha só uma profissão, mas uma missão.” A frase do Papa Francisco foi citada durante o evento “Caiu na rede – comemorando o 52º Dia Mundial das Comunicações Sociais”, a partir da mensagem do Pontífice para a ocasião: “A verdade vos tornará livres – Fake news e jornalismo de paz”. 

Para refletir sobre o tema e celebrar a data, a Arquidiocese de São Paulo, em parceria com as Irmãs Paulinas e apoio da Pastoral da Comunicação Arquidiocesana (Pascom), da Revista Família Cristã, do Serviço Pastoral da Comunicação e da gravadora e editora musical Paulinas-Comep, realizou um debate em 26 de abril, no Auditório Paulo Apóstolo, na Vila Mariana. O 52º Dia Mundial das Comunicações Sociais é celebrado por toda a Igreja na Festa da Ascensão do Senhor, que em 2018 será em 13 de maio. 

O Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo Metropolitano de São Paulo e Dom Devair Araújo da Fonseca, Bispo Auxiliar da Arquidiocese e Vigário Episcopal para a Pastoral da Comunicação, participaram da mesa, junto a Márcio Campos, repórter do Grupo Bandeirantes de Comunicação, e Glaucya Tavares, mestra em Comunicação com especialização em Marketing. O debate foi mediado pela Irmã Helena Corazza, doutora em Comunicação pela USP e religiosa da Congregação das Irmãs Paulinas. 

‘A eficácia das fake news fica-se a dever, em primeiro lugar, à sua natureza mimética, ou seja, à capacidade de se apresentar como plausíveis. Falsas, mas verosímeis, tais notícias são capciosas, no sentido que se mostram hábeis a capturar a atenção dos destinatários, apoiando-se sobre estereótipos e preconceitos generalizados no seio dum certo tecido social, explorando emoções imediatas e fáceis de suscitar como a ansiedade, o desprezo, a ira e a frustração.’
Papa Francisco

Em sua fala, Dom Odilo recordou que os jornalistas são os primeiros destinatários da mensagem do Papa. “O Papa inicia sua reflexão perguntando ‘o que são as fake news ?’. Francisco fala sobre as fake news de hoje que são tantas, sobretudo quando temos bilhões de comunicadores e, portanto, as notícias falsas têm um grande potencial destruidor”, afirmou. 

Ele explicou que as notícias falsas são comunicação de inverdades e não são inocentes.

“Notícias falsas podem gerar guerras, podem ganhar eleições e causar danos morais, econômicos, criar desassossegos sociais e não contribuir para a paz e a convivência. O Papa convida a não produzir notícias falsas. A verdade liberta e quem busca a verdade não tem o que temer, quem caminha na verdade não tropeça. Sejamos também nós promotores da paz”, continou o Cardeal.

Dom Devair, por sua vez, ao falar sobre a preparação do evento, comentou que “nem tudo o que cai na rede é peixe”. Ela insistiu na importância de “ter a capacidade de duvidar sempre”. 

‘No projeto de Deus, a comunicação humana é uma modalidade essencial para viver a comunhão. Imagem e semelhança do Criador, o ser humano é capaz de expressar e compartilhar o verdadeiro, o bom e o belo. É capaz de narrar a sua própria experiência e o mundo, construindo assim a memória e a compreensão dos acontecimentos.’
Papa Francisco
 

 

VAIDADE

Márcio Campos convidou os participantes a fazer um exercício e a pensar sobre o quanto a vaidade pessoal pode gerar ou apoiar notícias falsas. “Quando temos o hábito de só curtir e compartilhar aquilo com o que concordamos, sem pensar se o que compartilhamos é bom ou não, é bem possível que cometamos erros, inspirados pelo nosso egoísmo”, disse. 

Sobre o fazer jornalístico, Márcio enfatizou que a primícia básica do jornalista é a verdade. “A notícia pode ter vários lados, mas não pode deixar de ter a verdade. Nós, na busca pela verdade, erramos. Se a empresa é séria, ela corrige. Eu não tenho compromisso com o erro. Mas, quando erro, peço desculpas”, comentou Márcio.

‘Informar é formar, é lidar com a vida das pessoas. Por isso, a precisão das fontes e a custódia da comunicação são verdadeiros e próprios processos de desenvolvimento do bem, que geram confiança e abrem vias de comunhão e de paz.’ 
Papa Francisco

Ele recordou também que a notícia falsa envolve dinheiro e reputação. “Uma vez que ela coloca em cheque a integridade das pessoas, a notícia falsa pode causar muitos danos. Nós que somos comunicadores temos a responsabilidade de fazer esse exercício diário”, explicou Márcio Mozer.

 

IMPACTO DAS NOTÍCIAS FALSAS

Ao falar sobre a comunicação institucional, Glaucya salientou que uma das grandes forças é integrar as pessoas que estão dentro da instituição ou organização. “A cultura do diálogo pode eliminar muitas notícias falsas, porque quando as pessoas que fazem parte de uma organização estão bem informadas, elas serão porta-vozes e não contribuirão para difundir notícias falsas.” 

Em relação ao fortalecimento da comunicação interna, a Mestra em Comunicação e Professora da Faculdade Paulus de Tecnologia e Comunicação insistiu que a comunicação interna é a marca, a identidade, a cara da instituição ou organização em relação ao mundo digital. “Quando se fortalece esse tipo de comunicação, a informação gera a cultura do diálogo, que é fundamental para que todos os envolvidos possam saber o que está acontecendo, quais as metas e os planos para atingir suas metas. Eu daria duas dicas: a primeira é a integração; as partes se conversarem constantemente (pequenas conversas semanais, produtivas); a segunda é o compartilhamento com o público externo, com verdade e transparência. Eu me comunico só quando eu quero vender um produto ou ideia? Ou me comunico com consistência?”, questionou. 

‘São louváveis as iniciativas educativas que permitem apreender como ler e avaliar o contexto comunicativo, ensinando a não ser divulgadores inconscientes de desinformação, mas atores do seu desvendamento.’
Papa Francisco

Outra questão importante na gestão de crises apresentada por Glaucya refere-se às informações compartilhadas. Ela comentou que 60% dos brasileiros confiam na mídia tradicional e que o País é o segundo do mundo que mais confia nesta. Outro dado significativo é o de que uma notícia falsa tem 70% de chances a mais de ser compartilhada do que uma verdadeira. “Para enfraquecer as fake news é preciso dar notícias verdadeiras e pertinentes. Em comunicação, não dá para se esconder”, continuou Glaucya.

‘O antídoto mais radical ao vírus da falsidade é deixar-se purificar pela verdade. Na visão cristã, a verdade não é uma realidade apenas conceitual, que diz respeito ao juízo sobre as coisas, definindoas verdadeiras ou falsas. A verdade não é apenas trazer à luz coisas obscuras, desvendar a realidade [...]. O único verdadeiramente fiável e digno de confiança sobre o qual se pode contar, ou seja, o único verdadeiro é o Deus vivo.’
Papa Francisco

 

JORNALISMO DE PAZ

Além da questão das notícias falsas, um aspecto intensamente abordado pelo Papa em sua mensagem é a do Jornalismo de paz. “Para mim, um jornalista de paz é aquele que se coloca a serviço da sociedade, do bem comum. Quando o veículo deseja ajudar as pessoas a serem melhores e a, com esperança, construírem um mundo melhor, estamos falando de um Jornalismo de paz. Aquele Jornalismo que se determina a levar a verdade, com transparência, sem manipulação. Sempre numa lógica de esperança e nunca numa lógica de morte, violência e da cultura do ódio”, explicou Glaucya ao O SÃO PAULO.

Embora em alguns casos existam outros fatores envolvidos na publicação de uma notícia, Glaucya salientou a relevância de o jornalista expor, com coerência, todos os fatos apurados. “O jornalista tem de buscar, naquilo que ele entrega, uma cultura de paz e não a propagação de uma informação unilateral. Ele pode se posicionar e fazer suas escolhas”, afirmou. 

Quando fala sobre a profissão e a missão do jornalista, o Papa Francisco afirma que “o melhor antídoto contra as falsidades não são as estratégias, mas as pessoas: pessoas que, livres da ambição, estão prontas a ouvir e, por meio da fadiga de um diálogo sincero, deixam emergir a verdade; pessoas que, atraídas pelo bem, se mostram responsáveis no uso da linguagem. Se a via de saída da difusão da desinformação é a responsabilidade, particularmente envolvido está quem, por profissão, é obrigado a ser responsável ao informar, ou seja, o jornalista, guardião das notícias”.

 

GRUPO IR AO POVO

O “Grupo ir ao Povo” participou do evento sobre o Dia Mundial das Comunicações Sociais com músicas relacionadas à comunicação. Criado pelo Padre Zezinho (José Fernandes de Oliveira), o grupo tem uma formação familiar e existe há 18 anos. Beto, Betinho, Ana Clara, Tiago e Giba (nomes artísticos da família Oliveira) colocam a serviço da comunidade e da canção católica suas experiências, talentos e dedicação. Com um repertório riquíssimo e variado, disponibilizam um serviço às dioceses que procuram artistas que cantem solidariedade, justiça e paz, privilegiando a Doutrina Social da Igreja. 

‘Para discernir a verdade, é  preciso examinar aquilo que favorece  a comunhão e promove o bem e  aquilo que, ao invés, tende a isolar,  dividir e contrapor.’
Papa Francisco

 

PARA NÃO CAIR NA SEDUÇÃO DAS FAKE NEWS

Em sua mensagem para o 52º Dia Mundial das Comunicações, o Papa Francisco define a expressão fake news como a “desinformação transmitida on-line ou nos mass-media tradicionais. Assim, a referida expressão alude a informações infundadas, baseadas em dados inexistentes ou distorcidos, tendentes a enganar e até manipular o destinatário. A sua divulgação pode visar objetivos prefixados, influenciar opções políticas e favorecer lucros econômicos”. 

“Quando falamos de critérios para não cair na sedução das fake news , estamos falando tanto do ponto de vista do não se enganar, mas também não compactuar”, explicou Glaucya à reportagem. Ao ser perguntada sobre o fato de alguns grupos serem mais suscetíveis a compartilhar esse tipo de notícias, a Docente explicou que, em geral, são as pessoas que têm menos acesso à informação, à leitura e a outros meios mais confiáveis. “Eles não têm acesso a uma informação de qualidade que gera um pensamento crítico e, muitas vezes, a manipulação acontece nas grandes e nas pequenas mídias. Em qualquer blog, site, tevê ou rádio pode existir também tipos diferentes de manipulação”, explicou.

‘Por isso, desejo convidar a que se promova um jornalismo de paz, sem entender, com esta expressão, um jornalismo bonzinho, que negue a existência de problemas graves e assuma tons melífluos.’
Papa Francisco

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