Em São Paulo, Arcebispo de Barcelona fala sobre Pastoral nas grandes metrópoles

A A
Cardeal Lluís Martínez Sistach participou de encontro com lideranças pastorais da Arquidiocese de São Paulo
Publicado em: 01/09/2015 - 17:00
Créditos: Redação

Em encontro com lideranças pastorais da Arquidiocese de São Paulo, realizado no sábado, 29, no auditório da Faculdade Paulos de Tecnologia e Comunicação (Fapcom), o arcebispo de Barcelona, Cardeal Lluís Martínez Sistach abordou o tema da pastoral nas grandes metrópoles. O Cardeal esteve na capital para algumas conferências e celebrações.

O evento da Fapcom foi uma reunião ampliada Conselho Arquidiocesano de Pastoral (CAP), com a presença do arcebispo de São Paulo Cardeal Odilo Pedro Scherer, dos bispos auxiliares, padre, coordenadores e demais agentes de pastorais, movimentos, novas comunidades, associações e organismos eclesiais

“O grande desafio que se propõe a Igreja católica é: seguirá sendo instrumento de Deus que alivia a dor do mundo? A Igreja católica tem uma missão fundamental, ser uma alternativa à globalização desumanizante dos mercados pondo-se ao serviço dos pobres e necessitados”, acrescentou o Arcebispo.

Dons e sinais de Deus

O Cardeal apresentou o que chamou de sinais dos tempos, graças e dons de Deus que podem ajudar a pensar, organizar, viver e realizar uma pastoral nas grandes cidades. Entre esses o documento Conclusivo da 5ª Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e Caribenho, em Aparecida (SP), em 2007, que convida a Igreja a um estado permanente de missão. “Aparecida impulsiona o passo de uma pastoral estática a uma pastoral dinâmica, de saída a todos. Sua urgência é chegar aos últimos. Para Aparecida, a missão não é proselitismo, senão, atração”, destacou.

Outro “dom de Deus” é o próprio Papa Francisco, ressaltando que ele vem de uma grande cidade. “Quando o Cardeal Bergoglio nasceu, em 1936, Buenos Aires já tinha mais de 2 milhões de habitantes. Ele é um Papa urbano, preocupado com a pastoral das grandes cidades”, disse, relatando, ainda, que durante uma conversa poucos dias antes do Conclave que o elegeu Pontífice, o cardeal argentino manifestou a Dom Lluis Martínez sua preocupação e interesse pela pastoral da grande Buenos Aires.

A Exortação Apostólica Evangelii Gaudium é também considerada pelo Cardeal Sistach um dom para a pastoral nas grandes cidades. Destacando o número 27 do Documento, o cardeal afirmou que considera este como o “sonho eclesial do Papa Francisco”. “Sonho com uma opção missionária capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo atual que à autopreservação. A reforma das estruturas, que a conversão pastoral exige, só se pode entender neste sentido: fazer com que todas elas se tornem mais missionárias, que a pastoral ordinária em todas as suas instâncias seja mais comunicativa e aberta, que coloque os agentes pastorais em atitude constante de ‘saída’ e, assim, favoreça a resposta positiva de todos aqueles a quem Jesus oferece a sua amizade”, apresenta o Documento.

Os dois Sínodos sobre a família, convocados pelo Papa Francisco, são considerados sinais para a evangelização da cidade. A assembleia Extraordinária de outubro de 2014, sobre os desafios da família, enquanto a próxima Assembleia Ordinária de outubro deste ano, sobre a vocação e missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo. O Cardeal Sistach também mencionou o Jubileu Extraordinário de Misericórdia proclamado pelo Santo Padre. “Na Bula de proclamação do Ano Santo, o Papa responde que este jubileu será convocado para que a Igreja redescubra o sentido da missão que o Senhor lhe confiou no dia de Páscoa: ser sinal e instrumento da misericórdia de Deus”, explicou.

Crescimento das cidades

O mundo se urbaniza cada dia mais. No mundo, 52% da população já vive nas grandes cidades. Enquanto no Brasil, já são 82% da população brasileira vivendo nos centros urbanos. “O Papa nos disse que a grande cidade produz uma espécie de ambivalência permanente, oferece seus cidadãos infinitas possibilidades que, às vezes, não se dão no mundo rural, mas aparecem muitas dificuldades para o desenvolvimento pleno da vida de muitos”.

O Cardeal apontou, ainda, alguns problemas fundamentais das pessoas que vivem nas grandes metrópoles, como a violência, o medo e o isolamento social. Há também uma desconfiança nas instituições sociais, econômicas e políticas. “O medo e a desconfiança nos fecha em grades e nos distancia um dos outros”.

Para Dom Lluiz Martinez, é curioso que há confiança em duas instituições tradicionais: a família e as religiões. “Historicamente, a religião tem tido um papel de consolo, refúgio e proteção”, destacou, informando que alguns sociólogos indicam que a medida em que aumenta a urbanização do mundo cresce a religiosidade. “Em 1980, era 83% da população mundial se considerava religiosa e em 2010, 30 anos depois, subiu para 89%”.

“O grande desafio que se propõe a Igreja católica é: seguirá sendo instrumento de Deus que alivia a dor do mundo? A Igreja católica tem uma missão fundamental, ser uma alternativa à globalização desumanizante dos mercados pondo-se ao serviço dos pobres e necessitados”, acrescentou o Arcebispo.

Olhar de fé

“A atuação da Igreja não tem que reduzir-se somente ao aspecto social, o que é muito importante. Mas também há toda a dimensão da espiritualidade, de moralidade, denúncia profética, celebração da fé, liturgia, oração, silêncio que a Igreja tem que oferecer aos cidadãos das grandes cidades”, pontuou o Cardeal, ao ressaltar que a Igreja oferece um “olhar de fé para as grandes cidades. “Já nos disse o Papa Francisco na Evangelii gaudium, ‘necessitamos reconhecer na cidade a partir de um olhar contemplativo, de fé, que descubra a presença de Deus que vive nas casas, ruas e praças’”.

“Deus vive na cidade, em suas alegrias, desejos esperanças, assim também como em suas dores e sofrimentos”, acrescentou, referindo-se ao Documento de Aparecida e recordando o Cardeal Bergoglio quando afirma que “Deus já vive nas periferias”. “Em um dos textos dos evangelhos, Jesus diz “pedi ceifadores”, não semeadores. Quer dizer que as sementes já foram lançadas. Deus trabalha no coração das pessoas”, comparou.

Lugar teológico

Para Dom Lluís Martínez, a cidade é também um lugar teológico. “Temos que examinar a cidade sobre muitos aspectos, sociológico, econômico, urbanístico, social, cultural, etc. Porém, antes de tudo, temos que ter uma interpretação teológica da cidade, como Deus vê o mundo. Deus olha para a cidade como um espaço de salvação, que necessita da encarnação do Filho”.

A saída missionária é a forma mais característica da pastoral urbana. “Aparecida fala de uma Igreja samaritana que une a mensagem e o gesto, a palavra e a obra, e que explica o que é, mediante o que faz”, afirmou, destacando que a Igreja humaniza a cidade. “O Evangelho é uma base para restaurar a dignidade da vida humana nas grandes cidades”.

Paróquia

O Cardeal afirmou que a paróquia é como uma fonte de água cristalina no meio da praça e do povo onde os as pessoas vão buscar água. "O Papa Francisco afirmou que a paróquia não é uma ‘estrutura caduca’, já que pode assumir muitas formas diversas, mantendo, no entanto, seu caráter de presença eclesial em um território no qual se escuta a palavra de Deus, se vive uma vida cristã, a caridade e a fé”. Ele também reforçou que os templos das grandes cidades devem ser portos de salvação da humanidade que nelas habitam, lugares agradáveis, que suscitem a elevação do espírito para que cada pessoa se reencontre com o seu próprio coração. “As metrópoles necessitam que as igrejas, em maior número possível, estejam aberta e sejam lugares de silêncio encontro e oração.

Acolhida

“Há muitas pessoas solitárias, que buscam companhia. As paróquias, as comunidades, os movimentos, os cristãos, as famílias cristãs devem acolher. Uma colhida que se faz com a atitude de Jesus, que não veio ao mundo para condenar, mas para salvar, isto é, uma acolhida misericordiosa, de amor, afeto.  Isso já humaniza, já realiza uma pastoral importante, que se entende”, disse o Arcebispo, lembrando, ainda, da importância do diálogo. “Temos que dialogar com todas as culturas, com muita sensibilidade, sem perder a identidade, sem relativismos, e nos encontraremos, porque no fundo de toda cultura autêntica se encontra também a Deus”.

Cultura digital

Dom Lluiz Martínez chamou atenção para as novas formas de comunicação predominantes nas cidades e reforçou que a pastoral tem de estar nesses meios. “Porém, é preciso ter claro que os jovens entram mais nas redes gerais já existentes que nas eclesiais, portanto, precisamos estar presentes nesses ambientes”.  

Família

O Cardeal Sistach ressaltou o valor da família e da comunidade eclesial para a evangelização nas grandes cidades. O Arcebispo também lembrou que a família cristã é uma igreja doméstica e está presente em todos os bairros. “As famílias cristãs também estão nas periferias, favelas, portanto, a Igreja já está lá. Mas as famílias, no entanto, devem abrir suas casas para convidar os vizinhos, amigos, conhecidos, que creiam ou não, e de vez em quando, tomar um cafezinho, conversar um pouco, tratar o que interessa a todos. Se poderá rezar um pouco, ler um texto bíblico, fazer um primeiro anúncio. E alguns desses que vão à Igreja doméstica poderão passar à Igreja paroquial para celebrar a fé. Temos que sair da Igreja, porém, não só os sacerdotes, mas também os leigos”.  

Leigos

Falando sobre o específico dos leigos cristãos na evangelização das cidades, o Cardeal Sistach retomou o que ensina o Concílio Vaticano II sobre sua missão no mundo, nos meios seculares, como a família, cultura, política, economia, entre outros âmbitos. “Todos os problemas que existem nas grandes cidades que incidem na pastoral podem se solucionar se os leigos cristãos estiverem mais presentes nas áreas onde se tomam decisões sociais, culturais, políticas e econômicas”.