Diplomacia a serviço da paz

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<p>Cardeal Parolin&nbsp;defende&nbsp;a ativa participação da Igreja nas questões de interesse internacional.</p>
Publicado em: 24/03/2015 - 11:00
Créditos: Jornal O SÃO PAULO – Edição 3043
Por Filipe Domingues

Construir pontes, lutar contra a pobreza e edificar a paz. São essas as três principais linhas de ação da diplomacia da Santa Sé no pontificado do Papa Francisco afirmou, ao O SÃO PAULO o Cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado do Vaticano. O “número dois” do Vaticano esteve em 11 de março na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma, onde deu uma palestra sobre o papel da diplomacia pontifícia na promoção da paz. No final da conferência, Dom Parolin respondeu à pergunta da reportagem sobre qual é a influência e o poder de decisão dos papas nas atividades diplomáticas da Santa Sé, já que o Papa Francisco foi o principal articulador da recente retomada de relações bilaterais entre Estados Unidos e Cuba após 53 anos de impasse – além de suas tentativas de promover a paz entre Israel e Palestina.

“Nós dizemos que o Papa é o primeiro diplomata da Santa Sé”, afirmou o Cardeal em sua réplica. “Efetivamente, todo o aparato da diplomacia pontifícia está a serviço das indicações que vêm do Papa.”

Atualmente, a Santa Sé tem relações diplomáticas com 179 países, além da União Europeia e o Estado Palestino. De acordo com o Secretário de Estado, chefe de relações internacionais do Vaticano, Francisco tem um “protagonismo muito acentuado” nas questões diplomáticas. Foi no seu primeiro discurso a novos embaixadores que o Papa falou pela primeira vez sobre o que considera suas prioridades. “Ele deu três linhas diretivas para a ação da diplomacia da Santa Sé: construir pontes, lutar contra a pobreza e edificar a paz. Nós estamos nos movendo sobre essas linhas”, lembrou.

“Muitas das iniciativas que a Secretaria de Estado e a diplomacia pontifícia levam adiante nascem diretamente dele e do contato pessoal que ele tem com chefes de Estado, com representantes políticos”, acrescentou Dom Parolin. De fato, no caso Cuba-Estados Unidos, Francisco vinha enviando cartas privadas aos presidentes Barack Obama e Raúl Castro e, em março do ano passado, conversou pessoalmente com Obama. Posteriormente, o Vaticano, com a presença do Cardeal Parolin, sediou a última reunião entre as delegações dos dois países antes do acordo para retomar relações diretas.

Segundo o Cardeal, cada papa, dependendo do seu perfil, “é mais ou menos ativo” na diplomacia. “No fundo, sempre existem orientações. A ação da Santa Sé é essencialmente religiosa e exatamente por essa motivação procura favorecer a convivência pacífica entre os povos, criando todas as condições que permitam a cada pessoa viver dignamente, segundo a sua dignidade, e como criatura e filho de Deus.”

Mais que uma voz crítica

Durante sua palestra, o Cardeal defendeu a ativa participação da Igreja nas questões de interesse internacional. “A ação diplomática da Santa Sé não se contenta a observar os acontecimentos ou avaliar sua grandeza, nem pode ser somente uma voz crítica. É chamada a agir para facilitar a coexistência e a convivência entre as várias nações”, afirmou. “A Santa Sé opera no cenário internacional não para garantir uma segurança genérica, mas para sustentar uma ideia de paz que seja fruto de relações justas, de respeito às normas internacionais, de tutela dos direitos humanos fundamentais, começando por aqueles dos últimos, dos mais vulneráveis.”

Diálogo ou intervenção militar

Quando um dos sacerdotes estudantes da Gregoriana perguntou a Dom Parolin sobre a dificuldade de promoção da paz junto a quem pensa de forma diversa à da Igreja, o Cardeal manteve a postura discreta. “A realidade é assim. Existem tantas pessoas, tantas instituições, tantos Estados que não pensam como a Igreja. Ainda assim, houve um crescimento e um desenvolvimento da consciência sobre a paz”, observou. “Hoje se fala muito de paz e eu diria que isso também foi um resultado da presença e das relações da Igreja.”

Dom Parolin acrescentou que, frequentemente, a Santa Sé coloca em prática ações de “soft power” (algo como “poder suave”, em inglês), expressão que em política internacional se refere à capacidade de atração e persuasão, em vez da coerção e do uso da força. “Temos a ideia de paz como um bem precioso e insubstituível. Também individualmente nos países (por meio dos núncios apostólicos, os diplomatas do Papa), a diplomacia bilateral trabalha sobre esse ponto. Às vezes sem muito clamor, um pouco fora dos refletores, é possível progredir.”

Para o Secretário de Estado, é urgente que a comunidade internacional estabeleça mais claramente quais são as diretrizes para “intervenções humanitárias” de caráter militar para restabelecer a paz em países que enfrentam grupos terroristas, guerras civis ou milícias. São necessárias, ainda, claras políticas de reconciliação pós-guerra. “É preciso mais do que nunca mudar o paradigma. Operar para prevenir a guerra em qualquer forma”, avaliou.