Cardeal Dom Paulo: há 50 anos, testemunha da esperança

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Confira a Homilia de Dom Odilo na missa do Jubileu de Ouro Episcopal de Dom Paulo
Publicado em: 02/07/2016 - 06:30
Créditos: Redação

O dia 2 de maio de 1966 foi de bênção e esperança para a Igreja: foi quando o Beato Paulo VI nomeou frei Paulo Evaristo como bispo auxiliar da arquidiocese de São Paulo. Há 50 anos, no dia 3 de julho de 1966, frei Paulo Evaristo Arns foi ordenado bispo pela imposição das mãos do cardeal Agnelo Rossi, então arcebispo de São Paulo, de Dom Anselmo Pietrulla, bispo de Tubarão, SC., e de Dom Honorato Piazzera, bispo coadjutor de Lages, SC. A cerimônia aconteceu na paróquia do Sagrado Coração de Jesus, em Forquilhinha, pequena cidade de Santa Catarina, que viu nascer o menino Paulo Evaristo aos 14 de setembro de 1921.

O cardeal Rossi confiou-lhe o pastoreio da região Norte (Santana) da arquidiocese; já havia vários outros bispos auxiliares na imensa Igreja particular de São Paulo, cuja população crescia rapidamente. Com os migrantes, que chegavam sem parar à Metrópole, formavam-se bairros novos na extensa periferia, necessitando de assistência religiosa e ação evangelizadora.

Com o chamado a Roma, do cardeal Rossi, para estar à frente da Congregação para a Evangelização dos Povos, Paulo VI nomeou Dom Paulo como arcebispo metropolitano de São Paulo no dia 22 de outubro de 1970. Dom Paulo foi feito cardeal pelo mesmo beato Paulo VI no dia 3 de março de 1973 e recebeu a igreja titular de São Antônio de Pádua, na Via Tuscolana, em Roma.

Dom Paulo serviu a arquidiocese de São Paulo como arcebispo por quase 28 anos, até que entregou o governo pastoral ao seu sucessor, por ter atingido a idade da renúncia, em 15 de abril de 1998. Sua dedicação à Igreja e ao povo de São Paulo foi imensa.

Tratou de implementar as reformas do Concílio Vaticano II e de promover eficazmente a evangelização, o testemunho e a presença da Igreja na imensa metrópole. Era necessário ampliar as estruturas e serviços eclesiais, religiosos e assistenciais nas extensas periferias pobres da cidade, traduzindo em novas práticas pastorais as decisões e ensinamentos do Concílio sobre a Igreja; e isso requeria uma renovada formação doclero, dos religiosos e leigos.

Fazia-se necessário promover a justiça social, em sintonia com a Doutrina Social da Igreja, afirmando e defendendo a dignidade da pessoa, em conformidade com a antropologia cristã e as ricas orientações do Concílio, especialmente na constituição pastoral Gaudium et Spes. A Igreja precisava empenhar-se, como fermento na massa e sal da terra, na renovação da vida social, cultural e política do país, em tempos difíceis de cerceamento das liberdades democráticas, de perseguição política e de graves violações da dignidade humana. E Dom Paulo empenhou-se pessoalmente, mediando a solução de conflitos e dando coragem, amparo e confiança a muitas pessoas, que lutavam para que o Brasil voltasse a ser um país livre e democrático.

Seu lema episcopal – ex spe in spem (“de esperança em esperança”) - marcou seu episcopado. Movido pela esperança cristã, Dom Paulo continuou firme na promoção daquilo que a fé ensina e o amor exige, animando também a comunidade arquidiocesana a caminhar e agir na mesma esperança. Esta, de fato, é a atitude própria da Igreja de Cristo, que não esmorece no anúncio do Evangelho, mesmo quando ela precisa ir contra os poderes e a cultura dominante; mesmo quando os frutos não aparecem imediatamente, ou quando isso cobra o preço da perseguição.

“A esperança não decepciona”, afirma a Escritura (Rm 5,5); mais do que nas capacidades humanas, ela está fundada em Deus. A esperança oferece o horizonte largo à nossa existência e aponta para a razão de ser e a compreensão mais profunda da nossa vida. São Paulo nos lembra que não temos aqui morada permanente e que neste mundo somos peregrinos a caminho da “pátria definitiva” (cf Fl 3,20).

O livro do Apocalipse identifica esta pátria definitiva com a “Jerusalém celeste” (cf Ap 20), preparada por Deus para seus eleitos; Jesus identifica este lugar do futuro de Deus com a “casa do Pai”, onde há muitas moradas (cf Jo 14,2) e onde ele já está, glorificado, junto do Pai e do Espírito Santo. Esta esperança vem da certeza da fé no Deus bom, justo e misericordioso, que não chamou à existência o homem para a frustração, mas para a plenitude e para a felicidade; a esperança cristã baseia-se no Deus fiel às suas promessas, no Deus providente e próximo da humanidade, Deus pedagogo e pai, que ama, ensina, corrige, tem paciência e anima seus filhos, com infinita ternura e misericórdia.

A esperança cristã, porém, não é passiva, nem nos deixa de braços cruzados; ela nos move à conversão e a nos tornarmos cooperadores na obra de Deus. Ela nos leva ao empenho concreto para edificar este mundo “segundo Deus” e a colaborar com todos aqueles que também abraçam este projeto, animados pela mesma esperança. A Igreja é sustentada pela “teimosa esperança” e, por isso, anuncia o Evangelho, denuncia os males e convida a tecer o convívio social na justiça, no respeito e na solidariedade. A esperança motiva e dá coragem para o empenho na realização daquilo que é bom e na edificação das realidades terrestres, conforme o reino de Deus. A esperança cristã não deixa que nos sintamos desolados e vencidos, apesar do êxito ainda não alcançado.

Dom Paulo exerceu seu ministério episcopal, animado por essa esperança, deixando marcas profundas na cidade e na arquidiocese. Hoje, aqui nos reunimos em torno dele para agradecer a Deus pelos 50 anos de sua ordenação episcopal. Foi muita graça de Deus para ele e para a Igreja! Que Deus o conserve, conforte e recompense! Que Dom Paulo, na sua veneranda idade, continue a nos lembrar que é preciso ter coragem, sem nunca desanimar. De esperança em esperança!

Cardeal Odilo Pedro Scherer

Arcebispo de São Paulo

Sábado, 2 de Julho de 2016.

Homilia da Missa do Jubileu de Ouro de Dom Paulo Evaristo Arns.