Sou o Papa Francisco

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13/05/2020 - 20:30

Seria uma bela surpresa receber uma ligação do Papa Francisco diretamente no seu celular. Poderia até vir a suspeita de que se tratasse de um trote, pois o número do chamador não estava identificado, nem de onde partia a ligação. A voz, no entanto, era clara e inconfundível. Era ele mesmo, Papa Francisco, chamando no meu celular no dia 9 de maio, às 11h40.

“Sou o Papa Francisco”, foi logo falando e perguntando como eu estava. Feliz por ouvir a voz do Papa, em pessoa, falando pelo celular, procurei recuperar-me do susto, para entabular a conversa e responder que estava feliz com sua chamada e que, por enquanto, estava bem. “Está muito bem, destacar esse - por enquanto -, pois ouço dizer que em São Paulo muitos estão sofrendo com a pandemia da COVID-19”, disse ele.

Confirmei que entramos numa fase mais aguda da pandemia em São Paulo e no Brasil, e que o número de infectados e falecidos estava subindo rapidamente nesses últimos dias. E passei algumas cifras noticiadas pelas autoridades sanitárias e pela imprensa, relatando um pouco sobre as dificuldades para manter o isolamento social numa metrópole do tamanho de São Paulo. Francisco respondeu: “Que pena! Gostaria que soubessem que estou rezando por todos e pedindo a Deus para que possamos superar o quanto antes este sofrimento”.

Perguntou como estavam os pobres e o povo das comunidades mais humildes das periferias de São Paulo, pois tinha informações da incidência significativa da pandemia em alguns bairros pobres de São Paulo. Confirmei essa informação e lhe disse que a observância das restrições do isolamento social no meio da população pobre era bastante difícil, quer porque os pobres não contam com habitações adequadas para um isolamento restrito, quer ainda porque muitos deles precisam ir às ruas todos os dias para prover a sua subsistência mais elementar. Francisco disse que conheceu essa situação nas comunidades pobres de Buenos Aires, na Argentina.

Acrescentei que há o risco de colapso nas estruturas sanitárias, se o número de doentes graves subir muito rapidamente. Informei, também, que são muitas as iniciativas de solidariedade no meio do povo, nas comunidades da Igreja e nas instituições da sociedade civil, entre empresários e grupos econômicos para o socorro aos mais pobres e ainda para oferecer apoio às estruturas sanitárias públicas e privadas. Observei que as autoridades públicas, em geral, estão se esforçando para providenciar o necessário para a saúde do povo, mas que as crises suscitadas pela pandemia eram profundas.

O Papa manifestou a sua proximidade espiritual para com todo o povo e pediu que lhe dissesse que ele está rezando por todos e pedindo a Deus que a pandemia seja superada o quanto antes. Recomendou que transmitisse ao povo a sua bênção apostólica. Agradeci-lhe o interesse e a preocupação para conosco, manifestados por meio de sua ligação e pelas suas palavras de conforto e a bênção. Prometi-lhe que as transmitiria e que o povo ficaria muito feliz ao tomar conhecimento disso. E ele concluiu: “Sim, transmita minha bênção ao povo. E não se esqueçam: rezem por mim também!” E se despediu e desligou, enquanto meu coração ficou aos pulos de alegria!

A ligação do Papa possui muitos significados, que não pretendo esgotar nas poucas linhas que ainda me sobram no espaço deste artigo. A iniciativa revela a preocupação do Papa com todas as comunidades locais, mais ainda quando o povo passa por grandes sofrimentos. Francisco também tem ligado para lugares de países em conflito, ou atingidos por catástrofes naturais, ou graves crises humanitárias. Há cerca de duas semanas, ele ligou para Dom Leonardo Steiner, Arcebispo de Manaus (AM), sabendo da crise sanitária naquela cidade. O Papa não está insensível diante do sofrimento concreto do povo e, como um pai da grande família humana, ele se interessa pessoalmente em saber como as pessoas e as comunidades estão. E não é questão apenas de saber, pois informações não lhe faltam. O Papa se interessa pelas pessoas e, também, sofre com elas.

As palavras de Francisco, expressando proximidade e carinho para com as pessoas, são como um bálsamo de esperança para muitos e de conforto para quem sofre. É bom saber que não estamos sozinhos e esquecidos de todos. Quando alguém se interessa pessoalmente por nós, isso é um antídoto poderoso contra o desalento e medicina restauradora para a alma. Obrigado, Papa Francisco! Deus o conserve por muito tempo, e com saúde! 


Arcebispo Metropolitano de São Paulo
Publicado em O SÃO PAULO, na edição de 13/05/2020