Sinodalidade da Igreja

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07/08/2019 - 11:00

O 17º Curso Anual de Aprofundamento Teológico e Pastoral do Clero da Arquidiocese de São Paulo, realizado em Itaici, Indaiatuba (SP), de 5 a 8 de agosto, contou com a assessoria de Dom Joel Portella Amado, Bispo Auxiliar do Rio de Janeiro (RJ) e Secretário-geral da CNBB, além da contribuição valiosa do Padre José Arnaldo Juliano, de São Paulo, e do Padre Vânio da Silva, de Florianópolis (SC).

O tema foi a eclesiologia, tratado a partir de três enfoques específicos: sinodalidade, missionariedade e urbanidade. Essa reflexão sobre a Igreja está relacionada com a realização do 1º sínodo arquidiocesano de São Paulo (2018-2020) e com as novas Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil (2019-2023), aprovadas pela assembleia da CNBB em maio passado. O curso do clero também foi ocasião para uma análise e reflexão sobre os resultados do levantamento paroquial e da pesquisa de campo sobre a situação religiosa e pastoral da nossa Arquidiocese, realizados em 2018, como parte do sínodo arquidiocesano.

O Papa Francisco tem falado em várias ocasiões da sinodalidade como característica essencial da Igreja. Esse conceito se refere à comunhão e à corresponsabilidade que devem existir na Igreja, em todos os níveis, expressando-se em processos de participação na vida e na missão da Igreja. A Igreja não depende apenas das autoridades que estão à sua frente e têm nela as responsabilidades maiores. Todos os membros da Igreja receberam, pela graça do Batismo, dons e graças imensas para si mesmos e o chamado a participar na vida e na missão da Igreja, cada um, com o dom que recebeu e de maneira harmônica.

Isso não é novo na Igreja, e o Papa Francisco está traduzindo em conceitos e apelos atuais uma convicção que existe desde as origens da Igreja. Jesus usou a alegoria da videira e dos ramos. O tronco da videira é fundamental, mas é cada ramo que deve dar frutos. São Paulo usou a comparação do corpo e dos membros; na Igreja, Cristo é a cabeça do corpo e os cristãos são muitos membros do corpo, no qual há órgãos e funções diversos. O corpo inteiro é saudável e goza de vitalidade quando a relação entre cabeça, corpo e membros vai bem e quando cada membro e órgão realiza bem a própria função. Nessa teologia originária sobre a natureza e a vida da Igreja, fica claro que ela é dom e missão. Não é correto pensar a Igreja como uma instituição na qual alguns são proprietários e benfeitores e os demais são beneficiários e assistidos. Essa seria uma concepção “clericalista” de Igreja que acabaria estrangulando a vitalidade do corpo eclesial. Nela, pelo dom do Espírito Santo, somos todos beneficiários e, ao mesmo tempo, participantes de sua missão, com responsabilidades diversas. 

Ao longo da história da Teologia, essa realidade harmônica e corresponsável da Igreja foi traduzida em muitas expressões e comparações. Só para citar algumas das mais recentes, lembramos que no Concílio Vaticano II se destacou a realidade do “povo de Deus” e se acentuou a natureza “colegial” do ministério episcopal na Igreja e o exercício do ministério dos padres “em comunhão presbiteral”. A Conferência de Puebla (1979) destacou o binômio inseparável da “comunhão e participação”, como forma dinâmica da vida e missão das comunidades da Igreja. Outro binômio semelhante é “comunhão e missão”, que expressa bem a dinâmica da vida e testemunho da comunidade eclesial, junto com a dimensão inseparável da missão.

A missionariedade é outra dimensão essencial da natureza e da vida da Igreja, que existe para a missão que Jesus lhe confiou. A missão da Igreja consiste no anúncio do Evangelho e no testemunho da vida nova, suscitada pela fé em Cristo e a acolhida do Evangelho. O anúncio do Evangelho do Reino de Deus, feito de muitos modos, visa chamar as pessoas e o mundo a se voltar para Deus por meio de Jesus Cristo. O testemunho da vida nova também se expressa de muitíssimas formas, quer nas manifestações pessoais e públicas da fé, quer na vida virtuosa e santa, nas obras de caridade, misericórdia, justiça e esperança, quer na participação ativa na vida social, para levar o sal, a luz e o fermento do Evangelho a todas as instâncias da vida social e das ações humanas.

A urbanidade refere-se às condições próprias do ambiente e da cultura, nas quais estão inseridas a vida e a missão da Igreja em São Paulo, e que requerem discernimento e metodologias próprias. Tudo isso precisa ser levado em conta no processo sinodal, que vivemos em nossa Arquidiocese.

Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo Metropolitano de São Paulo
Publicado em O SÃO PAULO, na edição de 07/08/2019