Igreja de Cristo na Cidade

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28/01/2016 - 09:45

Acabamos de celebrar a festa do Padroeiro da arquidiocese e da cidade de São Paulo. Lembramos que a Igreja é parte dessa Metrópole desde o primeiro instante do seu surgimento, com a missão dos Jesuítas no Planalto de Piratininga. Ainda não havia a cidade de São Paulo e a Igreja já estava lá.

A bem da verdade, São Paulo nasceu em torno de uma escola e de um altar. O primeiro ato da fundação da cidade, reconhecido assim também hoje, foi a celebração da Missa na inauguração do Colégio. O Padre Manuel da Nóbrega era o Superior da missão; São José de Anchieta também estava lá: ainda não era padre, mas apenas um jovem de 19 ou 20 anos de idade, aspirante ao sacerdócio.

A participação ativa da Igreja na vida da cidade, desde sua primeira origem, nos leva a refletir sobre a presença da Igreja na Metrópole, ainda hoje. A vida da aldeia de Piratininga gravitava inteiramente em torno do Pátio do Colégio e da humilde capelinha que ali havia. Desse núcleo, irradiava-se a presença e a ação dos missionários para uma vasta região. Ao longo do tempo, a cidade mudou muito, assim como os seus desafios, que também interpelam a missão da Igreja presente nela.

Temos a consciência de que a Igreja não é mais o centro da vida da cidade; pelo menos, não é o único. A cidade grande tornou-se eclética, pluralista e complexa, com muitos centros de interesse, inclusive religiosos. A vida política organiza-se em base às estruturas do Estado, nas suas diversas representações e poderes. A sociedade civil organiza-se livremente, de acordo com o Estado democrático de direito. Cada um tem o direito de ser autônomo e de exercer a própria liberdade no respeito às normas da boa convivência.

No entanto, a cidade grande poderia transformar-se numa multidão de indivíduos justapostos, que vivem lado a lado sem interagir; na massa caótica, há o risco da solidão em meio à multidão e dos individualismos. Os membros mais frágeis e menos competitivos desta cidade imensa podem ficar esquecidos, à margem, sem chances de participar das oportunidades, cada vez mais disputadas.

Qual é o hoje papel da Igreja de Cristo nesta Metrópole? Também a Igreja de Nóbrega, Anchieta, Tibiriçá e Bartira deveria entrar na disputa do espaço social e do poder, do prestígio e da força política em benefício próprio? Deveria também ela entrar na lógica do mercado religioso, para atrair consumidores de bens religiosos a qualquer preço?

O Apóstolo São Paulo nos ajuda a compreender melhor a identidade e a missão da Igreja na cidade de São Paulo. Quando escreve aos Coríntios, que a Igreja é como um corpo, com muitos membros, unidos a uma única cabeça, que é Jesus Cristo (cf. 1Cor 12, 14-27), ele exclui que ela seja uma organização que vive por si e para si. Não é uma “sociedade anônima”, com organização e logística bem esperta para colocar seu produto na praça e influenciar a sociedade em benefício de si mesma.

Ele lembra, antes de tudo, que o corpo sem a cabeça está morto e não é ninguém nem tem identidade. É a relação vital entre cabeça e membros, e vice-versa, que dá sentido e vitalidade ao corpo. Assim, a Igreja, sem sua referência constante a Cristo Salvador, é como um corpo sem cabeça, sem identidade: um corpo morto.

Por outro lado, São Paulo lembra que também os membros não existem apenas para si mesmos: cada um existe em função dos demais e nenhum pode dispensar a ajuda dos outros membros. E cada um desempenha sua própria função. Os mais fortes protegem e servem os mais fracos, os quais são tratados com maior atenção e delicadeza. Essa comparação da Igreja de Cristo com o corpo humano ilustra bem a identidade da Igreja e a forma de participação de cada membro na vida da Igreja e da sociedade.

Essa mesma comparação também não poderia ser uma ilustração para a presença e missão constante da Igreja na cidade de São Paulo? Ela é parte da cidade; nela, vivemos e agimos como cristãos e nossa identidade nos ajuda a participar melhor da cidade e a servir os irmãos que vivem nesta grande casa comum, onde Deus também habita.

Publicado no jornal O SÃO PAULO - Edição 3086 - 28 de janeiro a 2 de fevereiro de 2016