'A exemplo de Jesus, Bom Pastor, Dom Paulo entregou, de maneira corajosa e abnegada, a sua vida pelo rebanho de Deus’

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Na tarde desta sexta-feira, 16, o Cardeal Odilo Pedro Scherer, arcebispo metropolitano de São Paulo, presidiu a celebração de exéquias do Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns
Publicado em: 16/12/2016 - 17:00
Créditos: Redação

Na tarde desta sexta-feira, 16, o Cardeal Odilo Pedro Scherer, arcebispo metropolitano de São Paulo, presidiu a celebração de exéquias do Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, arcebispo emérito de São Paulo, que morreu na quarta-feira, 14, aos 95 anos de idade.

“A exemplo de Jesus, Bom Pastor, Dom Paulo entregou, de maneira corajosa e abnegada, a sua vida pelo rebanho de Deus, que lhe fora confiado. Esteve próximo do povo, dedicou-se às ovelhas mais necessitadas de amparo, conduziu-as pelos caminhos seguros do Evangelho, defendeu-as contra ladrões e lobos e expôs a perigos a própria vida, por amor ao rebanho”, disse o arcebispo na homilia, cuja íntegra reproduzimos a seguir.

HOMILIA NAS EXEQUIAS DE DOM PAULO

 "Ex spe in spem" - de esperança em esperança este foi o lema episcopal que serviu de fio condutor para a vida pessoal e o serviço episcopal de Dom Paulo.

 Motivado e conduzido por essa grande Esperança, que aponta para a meta suprema de toda existência, Dom Paulo, consagrou a sua vida a Deus e aos irmãos, ao anúncio e testemunho da Boa Nova do amor, da justiça, da fraternidade, do perdão e da misericórdia. Os sinais dessa Esperança já podem ser percebidos nas pequenas esperanças buscadas e alcançadas a cada dia, durante a vida.

 “Senhor, quem morará em vossa casa e em vosso monte santo habitará?" (Salmo 14).  Assim pergunta o salmista, expressando o anseio de quem crê e espera em Deus, sabendo que,  neste mundo, "ninguém tem casa permanente". Mas Deus preparou para nós uma morada para sempre e Jesus, no Evangelho, confirma: "na casa de meu Pai há muitas moradas" e revelou que "vou preparar um lugar para vós” (cf. Jo 14, 2-3).

 Na sua casa, Deus nos quer todos reunidos um dia, na sua presença, em sua companhia, junto com todos os demais justos e filhos seus. Durante esses dias, nas missas celebradas durante o velório, várias vezes foi cantado: "No céu não haverá tristeza, doença, nem sombra de dor. E o prêmio do céu é a certeza de viver felizes com o Senhor". Esta é a grande meta da nossa Esperança, do Evangelho da Esperança anunciado e vivido por Dom Paulo.

 Mas, "Senhor, quem morará em vossa casa?" Quem alcançará essa meta? A Escritura responde: "aquele que caminha sem pecado e pratica a justiça fielmente! Quem cultiva a verdade no seu íntimo e não usa a língua para dizer falsidades contra o próximo; quem não prejudica seu irmão, nem se deixa corromper com os maus" ( Salmo 14) . E o Profeta exorta: "cumpri o dever e praticai a justiça, e vereis depressa minha salvação; minha justiça não tardará a se manifestar" ( Is 56,1) .

 O falecido Cardeal Dom Paulo acreditou nisso e deixou que essas palavras orientassem a sua vida inteira. Creu em Deus e confiou nas suas promessas. E isso lhe deu enorme sabedoria e força durante a sua vida longa, operosa e fecunda de frutos.

 Esta mesma esperança, unida à fé inabalável deu-lhe a sabedoria dos humildes, capaz de reconhecer o valor, a dignidade e a beleza de cada criatura, especialmente de cada pessoa humana; deu-lhe franciscana simplicidade para reconhecer o valor justo de cada criatura, o desapego dos bens materiais, a alegria da fraternidade, a coragem e o vigor dos profetas para denunciar os males que ofendem e humilham a dignidade das pessoas e do convívio social.

 Animado pela fé, esperança e amor, Dom Paulo serviu a arquidiocese de São Paulo como arcebispo, por quase 28 anos, até à sua renúncia, em 15 de abril de 1998. Sua dedicação à Igreja e ao povo de São Paulo foi imensa. Tratou de implementar as diretrizes do Concílio Vaticano II e de promover eficazmente a evangelização, o testemunho e a presença da Igreja nesta imensa metrópole. Ampliou as estruturas  eclesiais, religiosos e assistenciais nas extensas periferias pobres da cidade traduzindo em novas práticas pastorais as decisões e ensinamentos d Concilio. O povo humilde, pobre e sofrido mereceu o melhor de suas atenções de Pastor

Em nome da mesma esperança cristã, também promoveu a justiça social, em sintonia com a Doutrina Social da Igreja; empenhou-se na renovação da vida social, cultural e politica do país, em tempos dificeis de cerceamento das liberdades democráticas, de política e de graves violações da dignidade humana e dos direitos da perseguição pessoa. Dom Paulo empenhou-se pessoalmente, mediando a solução de conflitos e muitas pessoas feridas no corpo ou na sua dando amparo, coragem e confiança a dignidade, ou que lutavam por um Brasil livre e democrático.

Movido pela esperança cristã, Dom Paulo continuou firme na promoção daquilo que a fé ensina e o amor exige; e também animou a comunidade arquidiocesana e a sociedade inteira a caminhar e agir na mesma esperança. Com sua vida testemunhou que a Igreja de Cristo não deve esmorecer no anúncio do Evangelho, mesmo quando ela precisa ir contra os poderes e a cultura dominante; mesmo quando os frutos não aparecem imediatamente, ou quando isso cobra o preço da perseguição.

A exemplo de Jesus, Bom Pastor, Dom Paulo entregou, de maneira corajosa e abnegada, a sua vida pelo rebanho de Deus, que lhe fora confiado. Esteve próximo do povo, dedicou-se às ovelhas mais necessitadas de amparo, conduziu-as pelos caminhos seguros do Evangelho, defendeu-as contra ladrões e lobos e expôs a perigos a própria vida, por amor ao rebanho.

“Caminhemos na esperança! nos adverte o Apóstolo, sem nunca desanimar. Pois "a esperança não decepciona" (Rm 5,5). Mais do que nas capacidades e garantias humanas, ela está fundada em Deus, no Deus fiel às suas promessas, Deus justo, providente e próximo da humanidade, como recordamos agora, durante o Advento. Deus pedagogo e pai, que ama, ensina, corrige, tem paciência com seus filhos e os trata com infinita ternura e misericórdia.

 Senhor, quem morará em vossa casa? Em vosso templo santo, quem habitará? São Paulo nos lembra que não temos aqui morada permanente e que neste mundo somos peregrinos a caminho da "pátria definitiva" (cf Fl 3,20). O livro do Apocalipse identifica esta pátria definitiva com a "Jerusalém celeste" (cf Ap 20), preparada por Deus para seus eleitos; Jesus fala da "casa do Pai onde há muitas moradas (cf Jo 14,2) e onde ele próprio já está, glorificado, junto do Pai e do Espírito Santo, a nos esperar. “ Na casa de meu Pai há muitas moradas... Vou preparar um lugar para vós. E depois voltarei a vós e vos levarei comigo, a fim de que onde eu estiver, estejais também vós” (Jo 14,2-4).

Dom Paulo encerrou a sua peregrinação e já alcançou a meta. Em seu leito de enfermo poucos dias antes de morre ele sussurrava a quem o assistia: "vocês não percebem que estou partindo?"... Numa bela oração do nosso rito de exéquias, nós suplicamos: "que carregado nos ombros do Bom Pastor, ele mereça agora participar da alegria eterna, na companhia de Cristo e com todos os seus santos'

Que o Bom Pastor, a quem Dom Paulo serviu na pessoa dos irmãos, o acolha como sua ovelha amada "nos prados da vida eterna". Na Casa do Pai. E seu exemplo de vida nos ajude a caminhar na esperança. Morreu para este mundo. Que ele agora viva para Deus! Amém.